Explorando 'Herland' de Charlotte Perkins Gilman à Luz do Movimento Pós-Humanista
O romance Herland: A terra das mulheres de Charlotte Perkins Gilman é uma obra fascinante que oferece uma visão única de uma sociedade exclusivamente feminina, isolada do mundo exterior. Publicado em 1915, o romance apresenta um cenário utópico que desafia as noções convencionais de gênero, poder e civilização. Ao analisar "Herland" à luz do movimento pós-humanista, podemos explorar como a obra de Gilman antecipou algumas das preocupações contemporâneas sobre identidade, tecnologia e a relação entre humanos e não humanos.
O movimento pós-humanista questiona as fronteiras tradicionais entre o humano e o não humano, enfatizando a interconexão entre humanos, máquinas, animais e ecossistemas. Em "Herland", essa interconexão é evidente na forma como as mulheres da sociedade isolada são retratadas. Elas não apenas dominaram habilidades tradicionalmente associadas aos homens, como a ciência e a tecnologia, mas também desenvolveram uma relação simbiótica com a natureza ao seu redor. Essa visão de uma sociedade onde humanos e natureza coexistem harmoniosamente ressoa com as preocupações pós-humanistas sobre a necessidade de repensar nossa relação com o meio ambiente.
Além disso, "Herland" desafia as noções convencionais de identidade de gênero e sexualidade. Na sociedade de Herland, não existem homens, e as mulheres reproduzem por meio da partenogênese. Isso levanta questões interessantes sobre a natureza fluida da identidade de gênero e a possibilidade de transcender as categorias binárias de masculino e feminino. No contexto pós-humanista, onde os avanços tecnológicos estão desafiando as noções tradicionais de corpo e identidade, a visão de Gilman em "Herland" oferece uma perspectiva provocativa sobre como as identidades podem ser construídas de maneiras diversas e não convencionais.
Um legítimo precursor do pós-humanismo.
Trecho:
"Quanto à crítica de Terry, era verdade. Essas mulheres, cuja distinção essencial da maternidade era nota dominante de toda a sua cultura, eram muito deficientes no que chamamos de “feminilidade”. O que me levou à convicção de que os “charmes femininos” que apreciamos não são nada femininos, mas apenas reflexos da masculinidade — desenvolvidos para nos agradar porque elas precisam nos agradar —, nem um pouco essenciais ao desempenho. Mas Terry não havia chegado à tal conclusão.
— Esperem quando eu sair do confinamento! — murmurou ele.
Então ambos o alertamos.
— Terry, meu rapaz! Cuidado! Elas foram muito boas conosco, mas você se lembra da anestesia? Se fizer alguma travessura nesta terra virgem, cuidado com a vingança das Tias Solteironas! Vamos lá, seja homem! Não será para sempre.
Voltando à história:
Logo começaram a planejar e construir para as crianças, toda a força e a inteligência de todas devotadas a isso. Cada menina, claro, era criada sabendo de tudo sobre sua Tarefa Real, e tinham, mesmo então, ideias muito estimadas sobre o poder modelador da mãe, bem como da educação.
Que ideais nobres! Beleza, Saúde, Força, Intelecto, Bondade — para estes rezavam e trabalhavam.
Não tinham inimigos; entre si eram todas irmãs e amigas. A terra era boa, e um grande futuro começou a se formar em sua mente.
A religião que seguiam, de início, era muito parecida com a da Grécia Antiga — com deuses e deusas —, mas perderam interesse nas deidades da guerra e do lucro, e aos poucos se concentraram na Deusa Mãe. Então, conforme ficavam mais sábias, voltaram-se para uma espécie de Panteísmo Maternal.
Ali estava a Mãe Terra, produzindo frutos. Tudo que comiam era fruto da maternidade, da semente ao ovo. Pela maternidade nasceram e para a maternidade viviam — a vida era, para elas, o longo ciclo da maternidade.
Mas logo reconheceram a necessidade de melhoria além da mera repetição, e devotaram sua inteligência ao problema — como fazer as melhores pessoas. No começo, havia apenas a esperança de gerar mulheres melhores, depois perceberam que por mais que as crianças diferissem ao nascer, o crescimento real vinha depois, por meio da educação.
Assim, as coisas se puseram em marcha.
Quanto mais eu aprendia, mais apreciava o que essas mulheres haviam conquistado, e menos orgulho sentia do que nós, com toda a nossa masculinidade, fizéramos.
Entendam, elas não tinham guerras. Não tinham reis, nem padres, nem aristocracia. Eram irmãs, e conforme cresciam, cresciam juntas — não competindo, mas em ação unificada.
***
Orelha:
"Publicado pela primeira vez em 1915, Terra das mulheres mostra como seria uma sociedade utópica composta unicamente por mulheres.
Antes do leitor encontrar a suposta maravilha dessa utopia, terá de acompanhar três exploradores — Van, o narrador; o doce Jeff; e Terry, o machão — e suas considerações e devaneios sobre o país, no qual, os três têm a certeza de que também existem homens, ainda que isolados e convocados apenas para fins de reprodução. Um país só de mulheres, segundo os três, seria caótico, selvagem, subdesenvolvido, inviável.
Uma vez lá, Van, Jeff e Terry se dividem entre a curiosidade de exploradores com fins científicos e o impulso dominador de um homem, oscilando entre tentar entender mais sobre aquela utópica e desconhecida sociedade e o sonho de um harém repleto de mulheres que talvez estejam dispostas a satisfazê-los e servi-los.
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