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O Canon dos Prefácios em Ficção científica — Azazel por Isaac Asimov



Introdução


Em 1980, Eric Potter me pediu para escrever mensalmente um conto de mistério para uma revista da qual ele era o editor. Concordei, porque não consigo dizer não a pessoas simpáticas (todos os editores que conheço são pessoas simpáticas).

 

O primeiro conto que escrevi foi uma espécie de mistério-fantasia, estrelado por um pequeno demônio de dois centímetros de altura. Intitulei-o “Ajuste de Contas”. Eric Potter aceitou-o e publicou-o. No conto havia um personagem chamado Griswold, que era o narrador, e três outros homens (incluindo um personagem que era eu mesmo, embora isto não fosse declarado explicitamente, e que contava a história para os leitores), que eram sua audiência. Os quatro costumavam se encontrar toda semana no Clube Union. Eu pretendia escrever uma série de contos a respeito desses encontros no Clube Union.

 

Quando, porém, escrevi uma segunda história com o mesmo pequeno demônio de “Ajuste de Contas” (o novo conto se chamava “Uma Noite de Música”), Eric recusou-se a publicá-la. Ele me explicou que, na sua opinião, um pouco de fantasia não tinha importância, mas não queria que isso se tornasse um hábito.

 

Assim, coloquei de lado “Uma Noite de Música” e escrevi uma série de contos de mistério sem nenhum elemento de fantasia. Trinta dessas histórias (que, de acordo com as recomendações de Eric, não podiam ter mais de 2.000 a 2.200 palavras) foram mais tarde reunidas no meu livro The Union Club MisterIes (Doubleday, 1983). Não incluí “Ajuste de Contas” nessa coleção porque achei que, como o personagem principal era o pequeno demônio, não combinava com o resto das histórias.

 

Entretanto, eu não havia esquecido “Uma Noite de Música”. Odeio desperdícios, e não suporto a ideia de deixar algo que escrevi sem ser publicado. Por isso, procurei Eric e disse: “Aquela história “Uma Noite de Música”, que você não quis publicar... posso submetê-la a outra editora?”

 

Ele respondeu: “Claro que sim, contanto que você mude os nomes dos personagens. Quero que as histórias a respeito de Griswold e seus amigos sejam uma exclusividade da minha revista!”

 

Foi o que fiz. Mudei o nome de Griswold para George e reduzi a audiência para apenas uma pessoa, o personagem que contava a história e que era eu mesmo. Depois de fazer isso, vendi “Uma Noite de Música” para The Magazine of Fantasy and Science Fiction (F & SF). Pouco depois, escrevi outra história da série que já me havia acostumado a chamar de “Histórias de George e Azazel” (Azazel era o nome do demônio). Esta segunda história, “O Sorriso Roubado”, também foi comprada pela F & SF.

 

Acontece que sou diretor editorial de uma revista de ficção científica, a Isaac Asimov's Science Fiction Magazine (IASFM), e Shawna McCarthy, na época a editora da revista, alegou que não era justo que eu publicasse meus contos na F&SF.

 

Eu disse a ela: “Shawna, essas histórias de George e Azazel são contos de fantasia, e a IASFM é uma revista de Ficção científica.”

 

Ela replicou: “Então, transforme o pequeno demônio e sua mágica em um pequeno ser extraterrestre com uma tecnologia avançada e venda as histórias para mim.”

 

Eu fiz isso, e como gostava das histórias de George e Azazel, continuei a escrevê-las, de modo que agora posso incluir dezoito delas neste livro, que chamei de Azazel. (Apenas dezoito histórias puderam ser incluídas porque, livre das limitações impostas por Eric, pude tornar as histórias de George e Azazel duas vezes mais compridas que as de Griswold.)

 

Além disso, deixei mais uma vez de fora “Ajuste de Contas”, por achar que não tinha exatamente o mesmo sabor que as histórias subsequentes. Por ser a inspiração original de duas séries diferentes, “Ajuste de Contas” teve a triste sina de não se encaixar bem em nenhuma delas. (Não importa: o conto já apareceu em uma antologia, e pode aparecer no futuro com outros disfarces, de modo que o leitor não precisa ficar com muita pena.) Existem algumas observações que eu gostaria de fazer a respeito das histórias. Coisas que vocês provavelmente vão observar sozinhos, mas acontece que sou um tagarela.

 

1) Como já disse, omiti a primeira história que escrevi a respeito do pequeno demônio porque achei que não combinava com as outras. Minha linda editora Jennifer Brehl, porém, alegou que era indispensável uma primeira história contando como eu e George nos conhecemos e como o pequeno demônio passou a fazer parte da vida de George. Como Jennifer, embora seja um anjo de doçura, é impossível de contrariar quando cerra os pequenos punhos, escrevi um conto chamado “O Demônio de dois Centímetros” que atende a suas exigências e é a primeira história deste livro. Além disso, Jennifer decidiu que Azazel seria um demônio, e não um extraterrestre, de modo que estamos de volta ao terreno da fantasia. (A propósito: Azazel é um nome bíblico, e a maioria dos entendidos pensa tratar-se do nome de um demônio, embora a história seja um pouco complicada.)

 

2) George é mostrado como uma espécie de parasita, e eu detesto parasitas. Mesmo assim, gosto de George, e espero que vocês também. O personagem que conta as histórias (que é na verdade Isaac Asimov) é frequentemente insultado por George e no final sempre acaba perdendo alguns dólares para ele, mas não me importo. Como explico no final do primeiro conto, as histórias que ele conta valem o que ele me toma. Além disso, ganho muito mais dinheiro com esses contos do que eu dou para George... especialmente se levarmos em conta o fato de que o dinheiro que dou para ele é de mentira.

 

3) Lembrem-se, por favor, de que essas histórias são sátiras humorísticas. Se acharem o estilo exagerado e “anti-asimoviano”, essa foi a minha intenção ao escrevê-los. Tomem isto como advertência. Não comprem o livro esperando alguma coisa diferente, caso contrário, poderão ficar desapontados. Finalmente, se detectarem em algumas passagens uma certa influência de P. G. Wodehouse podem estar certos de que não é coincidência!


***

Tradução de RONALDO SÉRGIO DE BIASI

O Canon dos Prefácios em Ficção científica — Sonhos de Robô por Isaac Asimov

 


Sonhos de Robô por Isaac Asimov


INTRODUÇÃO

 

A ficção científica nos proporciona alguns tipos muito peculiares de satisfação pessoal. Quando se tenta descrever o possível desenvolvimento futuro da tecnologia, pode-se acabar chegando muito perto da verdade. Se você vive bastante tempo depois de escrever uma determinada história, pode acabar tendo o prazer de verificar que suas previsões eram razoavelmente exatas e ver-se saudado como uma espécie de profeta.

 

Isto me aconteceu no que diz respeito aos meus contos sobre robôs, dos quais "Verso de Luz" (incluído neste livro) é um exemplo.

 

Comecei a escrever histórias sobre robôs em 1939, quando tinha apenas dezenove anos. Desde o início os visualizei como máquinas cuidadosamente construídas por engenheiros e providas de mecanismos internos de segurança que denominei "As Três Leis da Robótica". (Desse modo eu me tornei a primeira pessoa a utilizar a palavra "robótica" num texto impresso; isso ocorreu no número de março de 1942 da revista Astounding Science Fiction.)

 

O fato é que nenhum tipo de robô pôde ter utilidade prática até meados da década de 70, quando os micro chips entraram em circulação. Somente então tornou-se possível produzir computadores suficientemente pequenos e baratos - ao mesmo tempo que eficientes e versáteis - para controlar um robô a um custo viável.

 

Dispomos hoje de máquinas industriais a que chamamos robôs, controladas por computador. Essas máquinas destinam-se cada vez mais a executar tarefas simples e repetitivas nas linhas de montagem - soldar, perfurar, polir etc. - e sua importância em nossa economia é cada vez maior.

 

Os robôs são hoje objeto de estudo de uma ciência específica, que recebe o nome criado por mim - a Robótica.

 

Claro que estamos apenas no início da revolução robótica. Os robôs que utilizamos hoje não passam de ferramentas computadorizadas, ainda muito longe de atingir a complexidade necessária para que possamos aplicar-lhes as Três Leis. Ao mesmo tempo, sua aparência física nem de longe lembra a de um ser humano, porquanto não são ainda os "homens mecânicos" que descrevi em minhas histórias e que já apareceram inúmeras vezes no cinema.

 

Ainda assim, é possível ver com clareza as tendências principais de sua evolução. Os robôs primitivos que hoje fazem parte de nossa realidade não são os "monstros de Frankenstein" que se apregoava nas histórias primitivas da ficção científica. Eles não ameaçam a vida humana (embora acidentes envolvendo robôs possam resultar em mortes, como ocorre em acidentes envolvendo automóveis ou instalações elétricas). São, ao invés disso, instrumentos cuidadosamente programados para poupar aos seres humanos a execução de tarefas árduas, repetitivas, perigosas e embrutecedoras, de modo que o propósito e a filosofia que inspiram sua criação são os primeiros passos na direção dos robôs que concebi em minhas narrativas.

 

Os próximos passos deverão representar um avanço nessa mesma direção. Algumas empresas já estão trabalhando em projetos que deverão ter uma aparência vagamente humana: serão "robôs domésticos", a quem caberá a execução de tarefas tradicionalmente destinadas aos criados.

 

O resultado de tudo isto é que hoje desfruto de um invejável prestígio entre as pessoas que efetivamente trabalham no campo da Robótica. Em 1985, foi lançada uma volumosa enciclopédia intitulada Handbook of Industrial Robotics (publicada pela John Wiley e coordenada por Shimon Y. Nof), para a qual escrevi uma introdução a pedido dos editores.

 

É claro que, para poder confirmar a exatidão das minhas previsões, precisei manter-me vivo por um bocado de tempo. Minhas primeiras histórias de robôs apareceram em 1939, como já disse, e tive que viver por mais quarenta anos para poder ver-me como "profeta". Por ter começado muito cedo e ter tido sorte bastante para sobreviver até hoje, isso se tornou uma realidade para mim. Não tenho palavras para descrever o quanto esta experiência é gratificante.

 

Na verdade, levei minhas previsões sobre o futuro da Robótica às últimas consequências em minha história "A Última Pergunta", publicada em 1957. Tenho uma leve impressão de que, caso a raça humana sobreviva, é mais ou menos nessa direção que ela evoluirá. Mas nossa capacidade de sobrevivência é limitada, e não terei oportunidade de verificar no futuro muita coisa quanto ao desenvolvimento dessa tecnologia. Terei que me contentar com a esperança de que as gerações vindouras possam testemunhar e aplaudir o acerto dessas outras predições que formulei. Quanto a mim, não estarei mais aqui.

 

Os robôs, entretanto, não são a única área em que minha bola de cristal se revelou eficiente. No meu conto "O Estilo Marciano", publicado em 1952, descrevi de modo razoavelmente fiel uma caminhada no espaço, embora esse feito só viesse a ser praticado quinze anos mais tarde. Antever um passeio no espaço não é, com certeza, uma façanha profética das mais notáveis, concordo - uma vez que se admita a existência de espaçonaves, todo o resto se torna inevitável. No entanto, descrevi também os efeitos psicológicos de um tal passeio, inclusive um bastante insólito... pelo menos para mim.

 

Entendam: eu sofro de acrofobia, e tenho verdadeiro pavor de alturas, o que me dá plena certeza de que nunca entrarei numa espaçonave por vontade própria. Mas, mesmo admitindo-se a hipótese de que eu fosse arrastado à força para dentro de uma, tenho certeza de que ninguém conseguiria obrigar-me a flutuar do lado de fora dela.

 

Ainda assim, consegui pôr de lado os meus medos e imaginei que um tal passeio seria capaz de produzir euforia. Fiz com que meus astronautas se pusessem a brigar pelo direito de sair da nave e flutuar em paz no meio das estrelas. E quando os passeios no espaço se tornaram uma realidade, os astronautas experimentaram esse tipo de euforia.

 

Em meu conto "A Sensação de Poder", publicado em 1957, lancei mão de computadores de bolso, cerca de dez anos antes de tais computadores se tornarem realidade. Cheguei mesmo a considerar a possibilidade de eles contribuírem para que as pessoas acabassem perdendo a capacidade de fazer operações aritméticas à maneira antiga. Atualmente essa é uma das grandes preocupações dos educadores.

 

Mais um exemplo: em meu conto "Sally", publicado em 1953, descrevi carros computadorizados que chegam quase ao estágio de criaturas dotadas de vida própria. Nos últimos anos têm aparecido automóveis controlados por computador que podem até mesmo falar com o motorista, embora as funções que são capazes de executar ainda sejam bastante simples.

 

Todavia, se a ficção científica nos dá o prazer de ver confirmadas algumas das nossas previsões, também nos faz experimentar a sensação oposta. Ela proporciona aos seus escritores certos constrangimentos que não se verificam em nenhum outro tipo de literatura. Evidentemente, se às vezes nossas previsões estão corretas, podem também estar equivocadas, e muitas vezes isso se dá de um modo bastante embaraçoso.

 

Tal embaraço torna-se particularmente visível quando nossos contos são reeditados em coletâneas como esta. No caso de um autor que começa a escrever ainda muito jovem, vive uma vida normal (como parece ser o meu caso) e escreve sem parar, é possível que uma coletânea deste tipo inclua histórias que foram escritas há trinta ou quarenta anos, e onde os eventuais defeitos da bola de cristal se tornam mais evidentes.

 

Comigo isso acontece relativamente pouco, porque há uma série de fatores que agem a meu favor. Em primeiro lugar, tenho uma boa formação científica, não é muito provável que eu cometa erros no que se refere a verdades científicas básicas. Depois, costumo ser muito cauteloso em minhas previsões, pois não tenho o hábito de ficar especulando a ponto de ir de encontro aos princípios científicos.

 

No entanto, a ciência está sempre avançando, às vezes produzindo resultados totalmente inesperados em poucos anos, o que pode deixar um escritor (inclusive eu próprio) num beco sem saída, cheio de fatos que perderam a validade. Minha pior experiência desse tipo foi com uma série de romances de ficção científica destinados ao público jovem, que escrevi entre 1952 e 1958. Esta série descrevia sucessivas aventuras de meus heróis em vários planetas do sistema solar, e em cada caso descrevi o planeta exatamente de acordo com o que a ciência sabia a respeito de cada um naquela época.

 

Infelizmente, foi exatamente nessa época que se desenvolveu a astronomia baseada em microondas, e logo depois começamos a enviar sondas para o espaço. O resultado disso é que nosso conhecimento do sistema solar sofreu um enorme avanço, começamos a aprender fatos novos e inesperados a respeito de cada um desses planetas.

 

Por exemplo, em minha descrição de Mercúrio em Lucky Starr and the Big Sun of Mercury, coloquei o planeta com uma face eternamente voltada para o sol, como os astrônomos imaginavam então, o que era um detalhe essencial para o enredo. Agora, no entanto, sabemos que Mercúrio executa uma rotação muito lenta e que cada porção de sua superfície acaba sendo iluminada pelo sol durante um certo tempo. Não existe o "lado escuro".

 

Em minha descrição de Vênus em Lucky Starr and the Oceans of Venus, falei de um imenso oceano que recobria toda a superfície do planeta, o que àquela época parecia possível. Era, do mesmo modo, um elemento indispensável ao desenvolvimento do enredo. Hoje, entretanto, sabemos que a temperatura na superfície de Vênus está muito acima do ponto de ebulição da água, o que torna totalmente impossível a existência de um oceano ou até de uma simples gota de água na superfície do planeta.

 

No que se refere a Marte, em meu livro David Starr: Space Ranger, fiz o possível para que minha descrição fosse exata em inúmeros aspectos. Mesmo assim, não tinha conhecimento dos grandes vulcões extintos descobertos em Marte quinze anos depois da publicação do livro. Além disso, referi-me aos canais secos deste planeta, e foi provado que esses canais não existem; utilizei também marcianos inteligentes, sobreviventes de uma civilização extinta que habitava a superfície - algo extremamente improvável em termos reais.

 

Júpiter e seus satélites apareceram em Lucky Starr and the Moons of Jupiter, e embora eu tenha sido muito cuidadoso ao descrever todos estes mundos, é claro que acabaram me escapando vários aspectos que só seriam descobertos pela ciência vinte anos mais tarde. Não fiz nenhuma referência às geleiras que recobrem Europa, ou aos vulcões em atividade que existem em Io. Não mencionei o enorme campo magnético de Júpiter. Do mesmo modo, em Lucky Starr and the Rings of Saturn, não me referi a alguns aspectos bem interessantes dos anéis e do sistema de satélites de Saturno.

 

O único livro da série que permaneceu intacto (cientificamente falando) foi Lucky Starr and the Pirates of the Asteroids.

 

Por sorte existe uma solução para este tipo de problema. A honestidade é a melhor política, e quando a série de Lucky Starr foi reeditada nos anos 70 insisti em acrescentar notas explicativas, indicando em que pontos as informações sobre astronomia tinham sido superadas. Os editores tiveram de início uma certa relutância, mas expliquei que não achava correto passar uma informação errada para um jovem leitor desinformado - ou, no caso de um jovem leitor bem informado, dar-lhe a impressão de que o desinformado era eu. Inseri as notas, portanto, e fico satisfeito em afirmar que isso não trouxe nenhum prejuízo às vendas.

 

Nenhum dos contos que formam esta coletânea foi tão abalado cientificamente quanto as aventuras do pobre Lucky Starr; mas algumas advertências devem ser feitas.

 

Em primeiro lugar, há um detalhe que me escapou apesar de ser (visto em retrospecto) bastante óbvio, e pelo qual venho me recriminando nos últimos dois anos.

 

Em "O Estilo Marciano", o mesmo conto onde aparece minha bem-sucedida descrição de um passeio espacial, fiz com que meus personagens se aproximassem de Saturno e chegassem a penetrar no seu sistema de anéis. Ao fazer isto, descrevi esses anéis cuidadosamente, utilizando todas as observações que haviam sido feitas a partir da superfície da Terra.

 

Bem... da superfície da Terra, cerca de 800 milhões de milhas de Saturno, vemos os seus anéis sólidos e maciços, a não ser pela linha negra da Divisão de Cassini, que parece dividi-los em dois. A porção dos anéis que fica mais próxima à superfície do planeta é consideravelmente mais embaçada do que o restante e em geral considerada como um terceiro anel (o "anel de crepe"). Foi assim que descrevi os anéis, vistos pelos olhos dos astronautas do meu conto. No entanto, parece óbvio (ou pelo menos parece óbvio agora) que se pudéssemos ver o sistema de anéis a curta distância o observaríamos com muito maior precisão de detalhe. Veríamos divisões - faixas onde há menos partículas em órbita, ou seja, veríamos linhas mais difusas separando linhas mais brilhantes, divisões que seriam simplesmente impossíveis de ver a grande distância. Os telescópios situados na superfície da Terra misturariam essas linhas e seriam capazes de registrar apenas a mais larga das faixas de pouco brilho - a Divisão de Cassini.

 

Quanto mais próximos estivéssemos, mais numerosas e delgadas se revelariam as linhas brilhantes, e cada vez maior seria a visibilidade, até que, quando atingíssemos um ponto de máxima proximidade, onde ainda nos fosse possível ter uma visão de conjunto dos anéis, eles nos apareceriam como os incontáveis sulcos de um LP - e é justamente com isso que eles se assemelham.

 

Suponhamos que eu tivesse pensado nisso em 1952 e tivesse descrito os anéis desse modo. Mesmo omitindo elementos como os "raios" escuros que cortam os anéis, ou os "anéis trançados", coisas que seriam impossíveis de prever, teria sido notável se eu tivesse imaginado essa divisão tão detalhada. Era algo fácil de deduzir, e, se naquela época eu tivesse descrito os anéis dessa maneira, não me seria muito difícil anunciar, depois que eles tivessem sido examinados de perto, que eu havia antecipado isto que acabava de ser descoberto. (Vocês pensam que a modéstia me impediria de falar? Não sejam idiotas.) Teria sido maravilhoso.

 

Do jeito que ficou, minha incapacidade de prever esse aspecto compromete minha inteligência, e está tudo lá, para quem quiser ver, em "O Estilo Marciano". Está bem, nenhum astrônomo sabia a verdade sobre os anéis em 1952, e daí? Um astrônomo é apenas um astrônomo, e sua visão das coisas é inevitavelmente limitada. Eu sou um escritor de ficção científica, de mim esperam-se resultados bem melhores.

 

Há outra coisa. Às vezes, quando eu previa algo com exatidão, ou quando previa algo que poderia revelar-se exato algum dia, geralmente projetava essa descoberta para um futuro excessivamente distante. Concordo que com os robôs isso não aconteceu, pois minhas primeiras histórias indicavam que eles começariam a aparecer nas décadas de 1980 e 1990, o que não está nada mal.

 

No entanto, o que me dizem dos carros computadorizados de "Sally" e dos computadores de bolso de "A Sensação de Poder"? Tive a cautela de não arriscar uma data exata para essas descobertas. (Posso ser estúpido, mas não sou tão estúpido assim.) No entanto, fica evidente, para quem lê as histórias, que estas são descobertas de um futuro remoto - e no entanto elas estão aqui hoje, e eu vivi o bastante para vê-las e para ficar embaraçado diante da minha falta de fé na engenhosidade humana.

 

Meu conto "Os Incubadores" aborda, em parte, o desenvolvimento de técnicas de defesa contra a bomba atômica. Ele foi publicado em 1951, e, embora eu não o situe numa época específica, a impressão que ele dá é a de que aqueles acontecimentos têm lugar num futuro próximo, talvez poucos anos depois de 1951. Eu estava claramente errado nesse aspecto, porque a discussão real sobre esse tipo de defesa não teve início senão depois de 1980.

 

E o que é mais: minha noção de um sistema de defesa era puramente estática - a criação de um campo de força formando um escudo forte o bastante para resistir até mesmo a uma explosão nuclear (a história, a propósito, foi escrita antes da invenção da bomba de hidrogênio). Hoje, quando consideramos a possibilidade de uma defesa nuclear, pensamos numa defesa ativa. A discussão hoje é sobre o uso de raios laser controlados por computadores para alvejar mísseis balísticos intercontinentais logo depois de seu lançamento, quando eles estiverem cruzando a atmosfera. Para ser franco, não creio que isso também possa funcionar, mas reconheço que é consideravelmente mais avançado do que minhas pobres especulações sobre o assunto em 1951.

 

Em geral, minhas melhores previsões são feitas a partir de um palpite, um bom e sólido palpite. Em minhas histórias sobre robôs, postulei a existência de robôs tão grandes que se viam reduzidos à imobilidade e não podiam fazer nada além de pensar e comunicar o resultado desses pensamentos. Um deles apareceu em minha primeira história sobre robôs. Nas histórias seguintes eu os chamei de "cérebros"; não me ocorreu chamá-los "computadores".

 

Meus robôs, também, tinham "cérebros" que os controlavam, e também nunca me referi a esses cérebros como "computadores". Tinha que lhes dar uma denominação que fosse tipicamente de ficção científica, e os chamei de cérebros positrônicos. Os positrons tinham sido detectados pela primeira vez apenas quatro anos antes de eu ter escrito minha primeira história de robôs.

 

Os positrons se revelaram como partículas fantásticas e nos sugeriam uma série de visões sobre a "antimatéria". Devido a isso, achei que "cérebros positrônicos" era uma expressão que soava bem. Tais cérebros não seriam essencialmente distintos de cérebros eletrônicos, exceto pelo fato de que os positrons poderiam ser produzidos em cerca de um milionésimo de segundo e logo aniquilados pelos elétrons que haveria à sua volta independentemente do ponto da Terra onde ele estivesse. Isso me deu a noção de que os positrons poderiam ser responsabilizados pela velocidade do pensamento. É verdade que as relações de energia - a energia necessária para produzir uma quantidade adequada de positrons ou a energia liberada quando essa quantidade de positrons é destruída - atingiriam cifras espantosas, numa tal escala que a ideia de cérebros positrônicos é uma total impossibilidade; mas eu não sabia.

 

Os computadores só começaram a aparecer em minhas histórias depois que foram realmente inventados e o público começou a ter consciência de que eles existiam; mas mesmo assim não cheguei a imaginar a possibilidade de sua miniaturização. É claro que me referi a computadores de bolso, mas eu os visualizava como algo cujas qualidades iriam pouco além das de uma régua de cálculo.

 

Depois de um certo tempo aceitei a ideia da miniaturização - depois que a coisa começou a acontecer, é claro. Em "A Última Pergunta", iniciei a história apresentando meu computador de sempre, o Multivac, do tamanho de uma cidade, porque eu só conseguia imaginar o crescimento dos computadores através de uma quantidade cada vez maior de tubos de vácuo amontoados em seu interior. Mas, no transcorrer da história, dei início a um processo de miniaturização, só que fui muito além do que me parece possível.

 

Mesmo assim, creio que os leitores estão sempre dispostos a perdoar quando um pobre autor de ficção científica vê suas ideias sendo ultrapassadas. Como já falei, meus livros sobre Lucky Starr não sofreram grandes prejuízos com isso. Para falar a verdade, A Guerra dos Mundos, de H.G. Wells, ainda é lido com avidez quase um século depois de sua publicação, a despeito de nos fornecer uma representação de Marte incrivelmente falsa (falsa em relação ao que sabemos hoje). O mesmo acontece com a descrição feita por Edgar Rice Burroughs uma geração depois de Wells, e por Ray Bradbury por volta de 1950, o que não impede que leiamos com prazer A Princesa de Marte ou As Crônicas Marcianas.

 

Isto é porque numa narrativa de ficção científica existe algo mais do que ciência. Existe a história, e se a ciência ali incluída é superada por novas descobertas ou distorcida porque o enredo o exige, nossa tendência é compreender, perdoar, e prosseguir na leitura.

 

Por exemplo: no meu conto "A Bola de Bilhar" faço uma bola de bilhar penetrar numa região do espaço onde ela atinge instantaneamente a velocidade da luz. Isso é claramente impossível, mas mesmo descontando essa impossibilidade inicial existe algo mais impossível ainda. A bola de bilhar tem um volume finito. Partes dela penetram nessa região antes do resto, e essas partes deveriam atingir instantaneamente a velocidade da luz e se separar do resto. Em resumo: a bola de bilhar deveria ser reduzida instantaneamente a átomos ou a partículas ainda menos substanciais, e no entanto, na minha história, a bola mantém a sua integridade física. Minha consciência doeu, mas deixei que ela continuasse doendo e fui em frente com a narrativa.

 

Em "O Garotinho Feio", utilizo a viagem no tempo, mesmo tendo a firme convicção de que viagens no tempo são algo impossível. No entanto, resolvi ignorar isso, porque a história trata do assunto muito ligeiramente; o tema real da história é o amor.

 

Também duvido de que os seres humanos venham a se transformar um dia em vórtices de energia, embora seja assim que eu os descreva em "O Que os Olhos Veem". E daí? O tema da história é a beleza das coisas feitas de matéria.

 

Creio que vocês já perceberam aonde quero chegar. Ao ler as histórias que se seguem, talvez encontrem trechos cientificamente incorretos ou tornados incorretos por descobertas científicas posteriores. Mas, se me escreverem a respeito disso, por favor digam também se, apesar disso, a história lhes agradou. Talvez não tenha agradado. Espero que sim.

 

Mais uma coisa. Minhas coletâneas de contos geralmente são editadas sem ilustrações, o que nunca me incomodou, porque não sou muito de visual. Meu mundo é o das palavras. Não obstante, esta coletânea é ilustrada por Ralph McQuarrie, e devo admitir que isso contribui de modo incalculável para a beleza do livro e mesmo para a compreensão das histórias, ao despertar no leitor o estímulo visual mais adequado. A ilustração de capa - que inspirou o conto "Sonhos de Robô", escrito para esta coletânea - é belíssima, humaniza um robô de uma maneira que eu jamais tinha visto antes. Nada disso é surpreendente, uma vez que Ralph é um dos melhores e mais influentes artistas da ficção científica, tendo trabalhado em filmes de sucesso como Guerra nas Estrelas e O Império Contra Ataca. Em 1986 ele ganhou um Oscar pelos efeitos especiais do filme Cocoon. Fico orgulhoso de tê-lo ao meu lado neste livro.

Isaac Asimov, 1986 


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Tradução: Bráulio Tavares e Anna Beatriz Sach

Editora: Record

Ano de publicação: 1991

Segunda Fundação — Isaac Asimov – Prólogos Imortais da Ficção Científica

Segunda Fundação

Isaac Asimov


PRÓLOGO

O Primeiro Império Galáctico durara dezenas de milhares de anos. Incluíra todos os planetas da Galáxia num regime centralizado, algumas vezes tirânico, outras vezes benevolente, mas sempre ordenado. Os seres humanos já haviam esquecido que pudesse haver qualquer outra forma de existência.

Todos, menos Hari Seldon.

Hari Seldon fora o último grande cientista do Primeiro Império. Fora ele que levara a ciência da psicohistória ao seu integral desenvolvimento. A psicohistória era a quintessência da sociologia, era a ciência do comportamento humano reduzida a equações matemáticas.

O ser humano individual é imprevisível, porém as reações das multidões humanas, descobriu Seldon, podem ser tratadas estatisticamente. Quanto maior a multidão, tanto maior a precisão que pode conseguir-se. E a grandeza das massas humanas com que Seldon trabalhava era nada menos do que a população da Galáxia que, no seu tempo, se contava por quintilhões. Foi Seldon, pois, quem previu, contra todo o senso comum e a crença popular, que o brilhante Império que parecia tão forte achava-se num estado de decadência e declínio irremediáveis.

Previu (ou resolveu as suas equações e interpretou os seus símbolos, o que vem a dar na mesma) que, entregue a si mesma, a Galáxia viria a atravessar um período de trinta mil anos de misé¬ria e anarquia antes de se estabelecer mais uma vez um governo unificado.

Meteu mãos à obra para remediar a situação, para provocar um estado de coisas que restaurasse a paz e a civilização num único milhar de anos.

Cuidadosamente, instalou duas colônias de cientistas a que denominou "Fundações". Instalou-as, deliberadamente, "em extremos opostos da Galáxia".

Uma Fundação foi estabelecida à luz plena da publicidade. A existência da outra, a Segunda Fundação, foi abafada pelo silêncio. Em Fundação (Gnome, 1951) e Fundação e Império (Gnome, 1952) descrevem-se os três primeiros séculos da história da Primeira Fundação. Começou como uma pequena comunidade de Enciclopédicos perdida no vazio da periferia exterior da Galáxia. Enfrentava crises periódicas a que era conduzida pelas variáveis das relações humanas e das correntes sociais e econômicas do tempo. Sua liberdade de movimentos estava restrita apenas a uma curta linha e quando se movia nessa direção abria-se diante dela um novo horizonte de desenvolvimento. Tudo fora planejado por Hari Seldon, então já morto há muito tempo.

A primeira Fundação, com a sua ciência superior, apoderou-se dos planetas bárbaros que a rodeavam. Enfrentou os anárquicos Condestáveis que deixaram o Império moribundo e derrotou-os. Enfrentou o que restava do próprio Império, sob o seu último Imperador forte e o seu último General forte, e derrotou-o.

Depois enfrentou algo que Hari Seldon não previra: o poder irresistível de um simples ser humano, um Mutante. A criatura, conhecida por O Mulo, nascera com a aptidão de moldar as emoções dos homens e de forjar as suas mentes. Os seus mais encarniçados opositores transformaram-se nos seus servos mais devotados.

Os exércitos não podiam, não queriam lutar contra ele. Perante ele, a Primeira Fundação caiu e os planos de Seldon transformaram-se parcialmente em ruínas.

Restava, porém, a misteriosa Segunda Fundação, o alvo das buscas. O Mulo devia encontrá-la para tornar completa a sua conquista da Galáxia. Os fiéis ao que restava da Primeira Fundação tinham de encontrá-la por uma razão totalmente oposta. Mas onde estava ela? Isso, ninguém sabia.

Esta é, então, a história da procura da Segunda Fundação!


O que é um prólogo? O prólogo é uma introdução presente em algumas obras literárias, frequentemente escrita pelo autor ou por uma terceira pessoa, que oferece ao leitor uma contextualização antes do início da narrativa principal. Ele pode esclarecer elementos importantes, como informações de fundo sobre os personagens, o cenário, ou a trama, preparando o leitor para a história que está por vir. Além disso, o prólogo pode explorar temas ou questões que serão centrais ao longo do livro, criando uma ponte entre o leitor e o universo ficcional da obra.

Fundação e Império — Isaac Asimov – Prólogos Imortais da Ficção Científica

Fundação e Império

Isaac Asimov



PRÓLOGO

A Decadência do Império Galáctico.

Era um Império colossal, alargando-se por milhões de mundos que iam de extremo a extremo da poderosa espiral dupla que formava a Via-láctea.

Esteve em declínio durante séculos antes de um homem se tornar realmente ciente dessa decadência. Este homem foi Hari Seldon, o homem que representou a única fagulha de esforço criador no meio da pressão da decadência. Criou e elevou a um alto grau de perfeição a ciência da psicohistória.

A psicohistória trabalha considerando não o homem, mas o homem-massa.

Era a ciência da multidão, multidão considerada no seu total de bilhões. Podia prever as reações com uma precisão que uma ciência menor só poderia resolver e prever com o mesmo rigor do ressalto de uma bola de bilhar. A reação de um homem não podia ser prevista utilizando a matemática, a reação de um bilhão é algo diferente.

Hari Seldon delineou as tendências sociais e econômicas da época, estendeu para frente as curvas evolutivas e previu o acelerado declínio da civilização e o intervalo de trinta mil anos que deveria transcorrer antes de um novo Império vigoroso poder emergir das ruínas.

Era muito tarde para impedir esse declínio, mas não muito tarde para impedir o aparecimento de um interregno de barbarismo. Seldon estabeleceu duas Fundações nos "extremos opostos da Galáxia" e a sua localização foi de tal modo calculada que os acontecimentos de um milênio deviam unir-se e entrelaçar-se de tal modo que levassem ao nascimento mais rápido de um Segundo Império, mais robusto e mais duradouro.

Fundação (Gnome Press, 1951) contou a história de uma destas Fundações durante os dois primeiros séculos de vida.

Começa com um povoamento de cientistas físicos em Terminus, um planeta colocado na extremidade de um dos braços da espiral da Galáxia. Separados dos distúrbios do Império, esses cientistas trabalharam como compiladores de um compêndio de conhecimento universal, a Enciclopédia Galáctica, desconhecendo o profundo papel que lhes fora destinado pelo já falecido Seldon.

Como o Império se fosse corrompendo, as outras regiões caíram nas mãos de "reis" independentes. A Fundação viu-se ameaçada por eles. Contudo, atirando os insignificantes soberanos uns contra os outros, sob a orientação do primeiro prefeito, Salvor Hardin, conseguiram manter uma independência precária. Sendo os únicos possuidores da força atômica no meio de mundos que estavam perdendo a cultura e regressando ao carvão e ao petróleo, conseguiram, por isso, ganhar um ascendente. A Fundação tornou-se o centro "religioso" dos reinos vizinhos.

Vagarosamente, a Fundação criou uma economia comercial ao mesmo tempo que a Enciclopédia recuava para um plano mais distante. Os seus comerciantes, negociando com instrumentos atômicos que o Império nem sequer podia ter copiado nos seus dias de maior solidez, penetravam centenas de anos-luz através da Periferia.

Sob Hober Mallow, o primeiro Príncipe Mercador da Fundação, desenvolveram as técnicas de guerra econômica a ponto de derrotarem a República de Korell, embora este mundo fosse apoiado por uma das outras províncias que tinha saído do Império.

Decorridos duzentos anos, a Fundação era o Estado mais poderoso da Galáxia, com exceção dos remanescentes do Império que, concentrados no terço central da Via-láctea, ainda controlavam três quartos da população e da riqueza do Universo.

Parece inevitável que o próximo perigo a ser enfrentado pela Fundação fosse um último golpe do Império agonizante.

O futuro deve ser esclarecido pela batalha entre a Fundação e o Império. 


O que é um prólogo? O prólogo é uma introdução presente em algumas obras literárias, frequentemente escrita pelo autor ou por uma terceira pessoa, que oferece ao leitor uma contextualização antes do início da narrativa principal. Ele pode esclarecer elementos importantes, como informações de fundo sobre os personagens, o cenário, ou a trama, preparando o leitor para a história que está por vir. Além disso, o prólogo pode explorar temas ou questões que serão centrais ao longo do livro, criando uma ponte entre o leitor e o universo ficcional da obra.

Nêmesis — Isaac Asimov – Prólogos Imortais da Ficção Científica

Nêmesis

Isaac Asimov


Prólogo

Estava ali sentado, sozinho.

Do lado de fora estavam as estrelas, e uma estrela em particular, com seu pequeno sistema planetário. Podia vê-la com os olhos da mente, mais nitidamente que a veria na realidade se se desse ao trabalho de tornar a janela transparente.

Uma estrela pequena, avermelhada, da cor do sangue e da destruição e com um nome apropriado.

Nêmesis!

Nêmesis, a deusa da vingança divina.

Pensou novamente na história que ouvira na infância: uma lenda, um mito, uma fábula a respeito de um dilúvio universal que dizimara a humanidade pecadora, deixando apenas uma família para começar tudo de novo.

Desta vez, não ia haver nenhum dilúvio. Apenas Nêmesis.

A degeneração da humanidade tinha acontecido de novo e a vinda de Nêmesis era um castigo apropriado. Não seria um dilúvio. Nada tão simples quanto um dilúvio.

Mesmo que houvesse sobreviventes... para onde iriam?

Por que não sentia nenhuma tristeza? A humanidade não podia continuar daquele jeito. Estava morrendo aos poucos, em consequência dos próprios crimes. Se a morte lenta e sofrida fosse substituída por uma muito mais rápida, isso seria motivo de tristeza? Ali, em órbita em torno de Nêmesis, havia um planeta. Em órbita em torno do planeta, um satélite. Em órbita em torno do satélite, havia Rotor.

No antigo dilúvio, os sobreviventes haviam usado uma arca. Tinha apenas uma ideia vaga do que era uma arca, mas Rotor desempenharia o mesmo papel. Levava com ele uma amostra da humanidade que estava a salvo e que construiria um mundo novo e muito melhor.

Para o velho mundo, porém... só havia Nêmesis!

Pensou de novo na questão. Uma estrela anã vermelha, em sua trajetória inexorável. Ela própria e seu sistema planetário não corriam nenhum perigo. O mesmo não se podia dizer da Terra.

Terra, Nêmesis está chegando!

Trazendo com ela a Justiça Divina!


O que é um prólogo? O prólogo é uma introdução presente em algumas obras literárias, frequentemente escrita pelo autor ou por uma terceira pessoa, que oferece ao leitor uma contextualização antes do início da narrativa principal. Ele pode esclarecer elementos importantes, como informações de fundo sobre os personagens, o cenário, ou a trama, preparando o leitor para a história que está por vir. Além disso, o prólogo pode explorar temas ou questões que serão centrais ao longo do livro, criando uma ponte entre o leitor e o universo ficcional da obra.

Cronologia da Série Fundação de Isaac Asimov

A "Trilogia da Fundação" de Isaac Asimov, ganhadora de um Prêmio Hugo especial de Melhor Série de Ficção Científica de Todos os Tempos, provavelmente é a "trilogia" de ficção científica mais duradoura e conceituada já escrita. Uma trilogia apenas por asserção e histórico de publicação, ela é composta de cinco contos e quatro novelas publicadas em série entre 1942 e 1950, que foram republicadas como uma trilogia no início da década de 1950. Desde sua publicação inicial, Asimov estendeu a trilogia - com a adição de quatro romances publicados entre 1982 e 1993 - para uma série de sete volumes; ao fazer isso, ele também integrou essa série expandida da Fundação em um grande projeto de quinze livros inter-relacionados e sete contos adicionais que contêm dezesseis histórias de robôs, os quatro romances de robôs de Asimov e os três romances do Império também de Asimov. 



Jim Burns - Dors Venabili - personagem de Isaac Asimov

 

***

Dors Venabili é um personagem de ficção científica na série "Foundation" de Isaac Asimov. Ela é uma robô androide altamente avançada, projetada para proteger a personagem principal da série, Hari Seldon. Dors é descrita como uma mulher bonita e inteligente, com habilidades físicas e mentais superiores às dos humanos normais. Ela é um dos personagens mais importantes da série e desempenha um papel crucial na proteção de Seldon e no sucesso do plano de Seldon para salvar a humanidade da queda do Império Galáctico.

… Para Onde Vamos? Isaac Asimov - Introdução

Antologia organizada por Issac Asimov

Introdução

De há muito considero a ficção científica como um instrumento em potencial, inspirador e útil, para o ensino. Para esta antologia, portanto, selecionei dezessete histórias que, penso eu, podem inspirar curiosidade e podem conduzir o estudante dentro dos esquemas de indagação de seu interesse particular, que mais o entusiasmem, que podem até mesmo determinar a futura diretriz da sua carreira.

Isto não quer dizer, entretanto, que todas as histórias são cientificamente corretas, embora, naturalmente, algumas sejam realmente acuradas pelos padrões do nosso tempo. Afinal de contas a história de ficção científica não pode ser (exceto por inspiradora conjectura) mais acurada do que torna possível o conhecimento científico dos nossos tempos. Uma história escrita em 1925 somente por acidente pode ser acurada, em parte, com referência a Plutão, o nono planeta; a situação é similar quanto a histórias, sobre a bomba atômica, escritas em 1935; sobre satélites artificiais, escritas em 1945; sobre quasars, escritas em 1955 e assim por diante.

Em muitas histórias de ficção científica um princípio cientifico é deliberadamente destorcido, com a finalidade de tornar possível um determinado enredo.É uma realização que pode ser conseguida com perícia por um autor versado em ciência ou de modo canhestro por um outro menos versado na matéria. Em ambos os casos mesmo no último, a história pode ser útil. Uma lei da natureza que é ignorada ou destorcida, pode suscitar mais interesse, algumas vezes, do que uma lei da natureza que é explicada. São possíveis os eventos apresentados na história? Se não o são, por que não? E ao tentar responder a tal pergunta o estudante pode algumas vezes aprender mais a respeito da ciência, do que com uma série de demonstrações corretas feitas em salas de estudo.

Esta antologia foi preparada, portanto, obedecendo a diferentes níveis.

Em primeiro lugar, as dezessete histórias aqui reunidas são todas de boa qualidade, engenhosas e excitantes, cada uma à sua maneira. Todos os que assim desejarem podem lê-las pelo prazer que por si mesmas oferecem, sem fazer nenhum esforço consciente para com elas aprender algo, podendo mesmo ignorar totalmente os comentários particulares que faço depois de cada uma delas.

Para os desejosos de uma investigação mais profunda, escrevi depois de cada história umas poucas centenas de palavras de comentário, abordando os pontos científicos apresentados em cada uma delas, apontando a sua validade ou, algumas vezes, explicando os erros cometidos.

Finalmente, depois de cada comentário, adicionei uma série de sugestões e perguntas destinada a conduzir a curiosidade do leitor em direções possivelmente proveitosas. Tais sugestões e perguntas não são simples nem têm a intenção de sê-lo. Na realidade, algumas vezes, formulo perguntas para as quais as respostas não são conhecidas. A despeito disto não faço sugestões e não existem respostas no final do livro. Apresento, entretanto, no final, um apêndice de dois itens para cada história que pode interessar aos que se sentirem fascinados pelos pontos científicos abordados. A Leitura Adicional pode não fornecer as respostas às perguntas por mim apresentadas, mas responderá a outras questões que não cheguei a formular, mas que secretamente podem ter ocorrido ao leitor.

E até mesmo tal apêndice, embora tosco e não-específico, apresento com relutância – porque desejo que o leitor sinta-se inteiramente à vontade e chegue às suas próprias conclusões. Não desejo apresentar respostas, mas sim estimular o pensamento. Não desejo oferecer soluções, mas dar causa àquela espécie de curiosidade que pode ser o início de uma diretriz própria.

Afinal de contas não existe nenhuma exigência para que os leitores acompanhem todas as linhas – ou uma única que seja – da investigação que sugiro, mas alguns deles podem fazê-lo, movidos pelo desejo que as histórias contidas nesta antologia venham a inspirá-los, ainda que tal desejo tenha sido nutrido por uma única dessas histórias.

Se tal acontecer, sentir-me-ei imensamente mais recompensado por cada leitor que venha a achar excitante ainda que apenas uma das tramas sugeridas e venha a lançar-se na busca de maior conhecimento, do que poderia sentir-me por apenas ter organizado uma interessante antologia

E os leitores que se sentirem assim envolvidos, serão também imensamente mais recompensados.

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*** Literatura e Ciência***

1.  UMA ODISSÉIA MARCIANA – Stanley G. Weinbaum

Existe Vida em Outros Planetas? – Poul Anderson (Croweli-Collier, 1963)
Não Estamos Sozinhos – Walter Sullivan (M 1964)

2.  NOITE – Don A. Stuart

Limites da Astronomia – Fred Hoyle (Harper, 1955)
Grandes Idéias e Teorias da Cosmologia Moderna – Jagjit Singh (Dover, 1961)

3.  E O DIA SE FEZ – Lester del Rey

A Humanidade em Formação – William Howelis (Doub 1959)
O Homem, o Tempo e os Fósseis – Ruth Moore (2 ed., Knopf, 1961)

4.  O PLANETA PESADO – Milton A. Rothman

O Tempo nos Planetas – George Obring (Doubieday, 1966)
A Terra, a Lua e os Planetas – Fred L. Wbipple (3 ed., Harvard University Press, 1968)

5.  A CASA QUADRIMENSIONAL – Robert A. Heinlein

Uma Revisão na Geometria – Irving Adiei (John Day, 1966)
Introdução à Geometria – H. S. Coxetcr (2 cd., Wiley, 1969)

6.  PROVA– Hal Clement

O Sol – Giorgio Abetti (MacMlllan, 1957)
As Estrelas - W. ICruse e W. Dieckvoss (University of Michigan Press,  1957)

7.  UM METRÔ CHAMADO MÕBIUS - A. J. Deutsch

Conceitos Intuitivos em Topologia Elementar – B. H. Amold (Prentice-Hall, 1962)
Experiências em Topologia – Stephen Barr (‘rhomas Y. Croweli, 1964)

8.  TENSÃO DE SUPERFÍCIE – James Blish

Células: Sua Estrutura e Função – E. I Mercar (Doubieday, 1962)
O Cortejo da Vida – Alfxed S. Romer (World, 1968)

9.  MÉDICO DO INTERIOR - William Morrison

Vida nos Planetas – Robert Tocquet (Grove, 1962)
Vida no Universo – Michacl W. Ovenden (Doubieday, 1962)

10.  OS BURACOS AO REDOR DE MARTE - Jerome Bix

Um Estudo Elementar da Mecânica Celestial – Ryabov (Dover, 1961)
A Astronáutica Para Professores de Ciências - John G. Meitner (Wfflcy, 1965)

11.  OS PASTOS SUBMERSOS – Axthur C. Clarke

O Mar – Lconard Engel
As Baleias – E. 1. SIijpcr (Basic Books, 1962)

12.  A CAVERNA DA NOITE - .James E. Gunn

Encontro Marcado na Lua - RiCharci S. Lewis (Vildng, 1968)
Até a Lua - John NoMe Wilford (Bantapi, 1969)

13.  PANO DE PÓ – HalClement

Guia Pictórico da Lua – Dinsmorc Alter (nomas Y. CroweU, 1967)
Bagagem Para Levar à Lua – NeiI P. Ruzic (Putnasn, 1965)

14.  PATÉ DE FOIE GRAS – lsaac Asimov

Traços Isotópicos na biologia - Martin 1’. Kamen (3 cd., Acadenile Press, 1957)
Isótopos – 1. L. Putnain (Peican, 1960)

15.  OMNILINGUA – H. Beam Piper

O Livro do Horizonte dos Mundos Perdidos – Leonaxd Cottxeli (American Heritage, 1962)
A Rocha de Dano: A Estória de Henry Rawlinsbn – Robert Silverberg (Helt,
Rinehart e Winston, 1966)

16.  O GRANDE SALTO – Walter S. Tevis

As Leis da Física – Milton A. Rothman (Basie Books, 1003)
Compreensão da Física – Isaac Asimov (Volume 1, Walker, 1966)

17.  ESTRELA–NÊUTRON – Lany Niven

As Marés – Edward P. Clancy (Doubieday, 1968)
Os Espantosos Pulsars – Science Year, 1969, p 37 (Fie Enterprises, 1969)

Trasplante obligatorio — La biología en la ciencia ficción




Contra-portada:
"Cuando la ciencia ficción penetra en la biología puede inducirnos a grandes especulaciones en el estudio de la vida. Con esta antología de relatos seleccionados por Isaac Asimov y sus colaboradores Martin H. Greenberg y Charles G. Waugh, tenemos ocasión de conocer la importancia de esta ciencia para los grandes maestros de la ciencia ficción. En este volumen se presentan doce relatos cuyo denominador común es la biología, tratando diferentes aspectos de la evolución, la biología celular, la genética, la fisiología, la reproducción o la ecología. En «Ruido atronador», Ray Bradbury nos sitúa en el año 2500, transportándonos al pasado en un peligroso safari a la Tierra. Poul Anderson, en «Los hijos del mañana», narra una historia de mutaciones genéticas y sus consecuencias después de una guerra atómica. En «Trasplante obligatorio», cuento que da título a esta antología, Robert Silverberg nos remite a una época y un lugar en el que los jóvenes se ven obligados a donar un órgano de su cuerpo. De lo contrario morirán irremediablemente. Los relatos de Fredric Brown, James S. Schmitz, Ursula Le Guin, Thomas N. Scortia, entre otros, completan este volumen."

***

Título original: Caught in the organ draft: Biology in Science Fiction

Contenido:

Introducción (Isaac Asimov, Introduction, 1983)
Prohibida la entrada (Fredric Brown, Keep out, 1954)
Cuerpo de investigación (Floyd L. Wallace, Student body, 1953)
Ruido atronador (Ray Bradbury, A sound of thunder, 1952)
Invariable (John R. Pierce, Invariant, 1944)
El exterminador (A. Hyatt Verrill, The exterminator, 1931)
Los hijos del mañana (Poul Anderson (como F. N. Waldrop), Tomorrow's children, 1947)
Mary y Joe (Naomi Mitchison, Mary and Joe, 1970)
Cambio marino (Thomas N. Scortia, Sea change, 1956)
Trasplante obligatorio (Robert Silverberg, Caught in the organ draft, 1972)
Nueve vidas (Ursula K. Le Guin, Nine lives, 1969)
Tierra extraña (Edmond Hamilton, Alien earth, 1949)
El abuelo (James H. Schmitz, Grandpa, 1955)

***

Isaac Asimov, Charles G. Waugh, Martin H. Greenberg, 1959.
Traducción: Hernán Sabaté
Diseño portada: Salinas Blanch

¿Qué es el método científico? — Isaac Asimov




¿Qué es el método científico?



Evidentemente, el método científico es el método que utilizan los científicos para hacer descubrimientos científicos. Pero esta definición no parece muy útil. ¿Podemos dar más detalles?

Pues bien, cabría dar la siguiente versión ideal de dicho método:

  1. Detectar la existencia de un problema, como puede ser, por ejemplo, la cuestión de por qué los objetos se mueven como lo hacen, acelerando en ciertas condiciones y decelerando en otras.
  2. Separar luego y desechar los aspectos no esenciales del problema. El olor de un objeto, por ejemplo, no juega ningún papel en su movimiento.
  3. Reunir todos los datos posibles que incidan en el problema. En los tiempos antiguos y medievales equivalía simplemente a la observación sagaz de la naturaleza, tal como existía. A principios de los tiempos modernos empezó a entreverse la posibilidad de ayudar a la naturaleza en ese sentido. Cabía planear deliberadamente una situación en la cual los objetos se comportaran de una manera determinada y suministraran datos relevantes para el problema. Uno podía, por ejemplo, hacer rodar una serie de esferas a lo largo de un plano inclinado, variando el tamaño de las esferas, la naturaleza de su superficie, la inclinación del plano, etc. Tales situaciones deliberadamente planeadas son experimentos, y el papel del experimento es tan capital para la ciencia moderna, que a veces se habla de «ciencia experimental» para distinguirla de la ciencia de los antiguos griegos.
  4. Reunidos todos los datos elabórese una generalización provisional que los describa a todos ellos de la manera más simple posible: un enunciado breve o una relación matemática. Esto es una hipótesis.
  5. Con la hipótesis en la mano se pueden predecir los resultados de experimentos que no se nos habían ocurrido hasta entonces. Intentar hacerlos y mirar si la hipótesis es válida.
  6. Si los experimentos funcionan tal como se esperaba, la hipótesis sale reforzada y puede adquirir el status de una teoría o incluso de una «ley natural».
Está claro que ninguna teoría ni ley natural tiene carácter definitivo. El proceso se repite una y otra vez. Continuamente se hacen y obtienen nuevos datos, nuevas observaciones, nuevos experimentos. Las viejas leyes naturales se ven constantemente superadas por otras más generales que explican todo cuanto explicaban las antiguas y un poco más.

Todo esto, como digo, es una versión ideal del método científico. En la práctica no es necesario que el científico pase por los distintos puntos como si fuese una serie de ejercicios caligráficos, y normalmente no lo hace.


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Isaac Asimov
Tirado de: 100 preguntas básicas sobre la ciencia
Alianza Editorial

A Sensação de Poder - Isaac Asimov (Conto Curto)




"Em meu conto "A Sensação de Poder", publicado em 1957, lancei mão de computadores de bolso, cerca de dez anos antes de tais computadores se tornassem realidade. Cheguei mesmo a considerar a possibilidade de eles contribuírem para que as pessoas acabassem perdendo a capacidade de fazer operações aritméticas à maneira antiga." (Introdução - Isaac Asimov)


A sensação de poder


Quando o velho técnico foi chamado pelo chefe dos programadores para uma reunião, não imaginava que o seu passatempo, descoberto por acaso semanas antes, iria causar tanto rebuliço. Nessa reunião, estavam presentes o presidente e generais, e o técnico nunca havia visto tanta gente importante na vida. Sem muita conversa, o programador perguntou ao técnico, na frente de todos:

— Quanto é nove vezes sete?

 Sessenta e três, – murmurou o técnico.

Foi um espanto. Todos sacaram seus computadores de bolso e conferiram a resposta. Seria o velho técnico um ilusionista? Como aquele homem podia copiar o resultado que o computador processava? Pediram explicações. O técnico falava pacientemente que havia 'bolado um jeito' de calcular usando o cérebro. Alguns debochavam, outros entendiam aquilo como uma piada de mau gosto. A seguir, pediram mais provas. Para grandes cálculos, o velho usava um bloco de papel. Extraordinário, um computador de papel! Mas o técnico se apressou em dizer que precisava do papel apenas para desenhar os números.

Os historiadores explicavam aos presentes que existia sim, havia muito tempo, uma forma de cálculo muito primitiva, e que os homens chegaram inclusive a fabricar computadores e outras coisas do zero. Era uma ciência perdida, mas provavelmente deviam ter existido estas técnicas. De alguma forma intuitiva, o velho técnico havia resgatado esta técnica, e inventou uma forma de cálculo que não fazia uso de computadores. Já os deputados e senadores debatiam com o presidente sobre a importância do invento: Por enquanto, não havia nenhuma utilidade, mas isso apontava o caminho que libertaria a máquina. A guerra, por exemplo: estavam em conflito contra um planeta vizinho, e era uma guerra de computador contra computador. A modernização dos computadores dava uma pequena vantagem, logo ultrapassada pelo outro lado, o que exigia um gasto exacerbado em tecnologia de ponta. Agora, com o 'cálculo humano' substituindo o computador – termo que se apressaram em batizar de grafíticos – a vantagem cresceria consideravelmente.

 Presidente – acrescentaram os deputados – quanto mais pudermos desenvolver estes grafíticos, mais poderemos desviar nosso esforço federal da produção de computadores e de sua manutenção. Assim que o cérebro humano assumir o poder, nossas melhores energias poderão ser canalizadas para procurar a paz, e a influência da guerra nos homens comuns será menor. Isso será mais vantajoso para o partido no poder, É claro.

O presidente ainda estava com o pé atrás. Não gostava muito da ideia de afrouxar as rédeas sobre os computadores, pois a mente humana era muito caprichosa. O computador sempre me apresenta a mesma resposta para o mesmo problema. Qual a garantia que temos de que com a mente humana seria assim? Ao que um cientista respondeu:  A mente humana apenas manipula os fatos. Não importa se a mente humana ou a máquina faz isso. Elas são apenas instrumentos.

A reunião acabou com um novo projeto aprovado. O Projeto Número, como acabou batizado, reuniu a nata dos programadores, cientistas e militares. E no meio deles, o velho técnico. Apesar de receber alto cargo e melhor salário, ele não se sentia muito à vontade com aqueles homens, e eles por sua vez não o tratavam em pé de igualdade. Em mais uma das intermináveis reuniões que participava todos os dias, ouviu dos cientistas que a meta era substituir os computadores, já que agora dominavam qualquer equação. Os militares já visionavam naves tripuladas, com humanos calculando grafíticos em tempo real e podendo inclusive corrigir trajetos ao passo que surgem novos problemas. Melhor: um deles sugeriu a ideia de mísseis tripulados por uma ou duas pessoas, o que aumentaria consideravelmente o poder de fogo dos armamentos. Computadores encarecem os projetos, e um míssil tripulado, controlando o voo, seria mais leve, ágil e mais inteligente. Isso daria uma vantagem que podia significar a vitória.

 Além disso, cavalheiros – um oficial retrucou – as necessidades da guerra nos obrigam a lembrar de uma coisa. Um homem é mais descartável que um computador. Mísseis tripulados podem ser lançados em maior número e sob circunstâncias que nenhum general empreenderia se usasse mísseis computadorizados.

Eles falaram sobre muitas outras coisas, mas o velho técnico não queria mais ouvir. Naquela noite, ele se recolheu mais cedo que o habitual, e na intimidade dos seus aposentos, elaborou cuidadosamente sua carta de despedida. Ela dizia o que se segue: "Quando comecei a estudar, isso não passava de um passatempo. Nada mais do que um agradável e prazeroso passatempo, um exercício para a cabeça. Quando o Projeto Número começou, achava que as pessoas fossem mais esclarecidas do que eu e que o que aprendemos poderia ser usado para ajudar a humanidade. Mas agora vejo que ele só será usado para a morte e a destruição. Não posso suportar a responsabilidade de ter inventado isso."

Depois, virou contra si o foco do despolarizador de proteínas e morreu instantaneamente.

Um enterro silencioso, sem muita pompa, seguiu-se na manhã do dia seguinte. Entre os presentes, o programador-chefe que havia descoberto o velho técnico. Mas aquilo já era passado: o técnico tinha dado sua contribuição, mas não era mais necessário. Agora que o projeto já estava em andamento, iria se desenvolver automaticamente até triunfar, tornando os mísseis tripulados uma realidade, juntamente com tantas outras coisas.

Nove vezes sete, pensou o programador com orgulho, sessenta e três. Não precisava mais que um computador lhe dissesse isso. Sua própria cabeça era um computador. E isso lhe dava uma fantástica sensação de poder.

***

ASIMOV, Isaac. Sonhos de Robô. Rio de Janeiro, Ed. Record, 1991.

Galeria Isaac Asimov Magazine BRASIL

Isaac Asimov Magazine

Saudosa coleção publicada no Brasil dos anos 1990 a 1992 pela editora record, com autorização da praticamente milenar Asimo's Science Fiction dos Estados Unidos. Aqui no Brasil, entretanto, só alcançou os parcos 25 números que são raramente encontrados hoje em dia. Falta de leitores? Crise econômica dos anos 1990? Mudanças na linha editorial da Record? Talvez um pouco de cada coisa, mas o fato é, que o desinteresse do público brasileiro pelo gênero é notório e já vem de uma outra empreitada, desta vez pela editora Globo, que publicou somente 20 números do Magazine de Ficção Científica entre maio de 1970 e novembro de 1971.

Estes poucos números entretanto, serviram para lançar uma série de novos autores da ficção científica brasileira, conhecidos hoje como a Geração IAM, destacando-se Roberto de Sousa Causo, Roberto Schima, Gerson Lodi-Ribeiro, Jose Carlos Neves e Cid Fernandez, que graças ao prêmio Jeronymo Monteiro foram incentivados e lidos nacionalmente. Um aspecto importante da Isaac Asimov Magazine foi a publicação de autores nacionais já conhecidos como André Carneiro e Jorge Luiz Calife entre outros.

Seguindo uma tradição criada pelos magazines americanos, em todos os números havia uma sessão chamada Depoimentos com assuntos temáticos onde também se publicou importantes autores locais, como Bráulio Tavares e Ronaldo Rogério de Freitas Mourão. Em praticamente todos ou números foram resenhados livros e filmes de ficção científica por Roberto de Souza Causo, e na sessão Cartas sempre havia comentários ou críticas bastante pertinentes e agradáveis de se ler. Os editoriais, como não poderia deixar de ser, ficavam a cargo do Isaac Asimov, infelizmente, não eram artigos escritos especialmente para a versão brasileira da revista, algo que teria sido interessante e talvez impulsionasse um pouco mais a IAM.


A revista tinha uma periodicidade mensal e era impressa na divisão gráfica da Distribuidora Record de Serviços de Imprensa. E o editor responsável foi o Ronaldo Sérgio de Biasi.


Lembro bem deste ultimo número, e do choque que foi para mim encontrar um pequeno box na página 10 com esse necrológico:

Conheçam todas as capas lançadas no álbum do Google+ neste LINK: https://plus.google.com/u/0/photos/103998711237758699926/albums/6114659251289470497?sort=1



Aqui está a minha coleção completa da IAM, já meio desgastada pelo tempo. Lembro-me de cada exemplar, todos conseguidos aqui em Londrina, onde só havia em uma banca que recebia o magazine, e nunca tinha um dia certo para chegar.

Por Herman Schmitz, o visionário.