Arte de Marcelo Galvan |
SUPER-HERÓI AO INVERSO
Agora, a velha nave pioneira e que por vezes chegou a ser guerreira, tem uma espécie de repouso nessas expedições científicas e turísticas pelos anéis da Via Láctea e imediações.
Sempre que se chega ao final do braço de Cygnus, se faz questão de levar a nave a um pequeno asteroide chamado de Bizarr, um objeto que circula a grande estrela de Luzir.
Nessa ocasião, se faz questão de volta-la de forma que sua proa se incline sobre o asteroide e o palco-visor do grande salão do Bar Já, o melhor de toda a espaçonave, se abra em close para a estátua equestre do Capitão Barbosa, esculpida na própria rocha de Bizarr.
Faz-se um circo em torno de uma simples escultura, que é a de homem montado sobre uma espécie de cavalo, num gesto de arremesso arrasador sobre o inimigo; as dimensões são muito superiores as do verdadeiro Capitão, e se lá em Nova Terrassol ele já era considerado bem mirrado, agora pareceria quase insignificante ao lado dessa estátua.
Depois dos aplausos com esse deslumbrante espetáculo, começa uma espécie de narrativa que varia muito pouco entre as suas apresentações.
— Da raça que a erigiu pouco sabemos. Sabemos somente que eram de fora da Via Láctea e das suas intenções que eram hostis, pois chegaram numa frota suicida, pilhando e dominando os planetas evoluídos que encontravam pela frente.
O nosso Conselho Galáctico Universal convocou as tropas estrelares dos Doze Mil Sóis para fazerem frente a essas naves inimigas e combaterem numa batalha que parecia de antemão destinada a se arrastar por eras.
Inesperadamente, as tropas foram desbaratadas e o inimigo avançava cada vez mais, já atravessando o centro da galáxia.
Foi então que se descobriu na terceira espiral, uma Nova Terrassol que estava clandestina desde o grande extermínio de toda vida inteligente de Terrassol.
A este povo audacioso e guerreiro, foi pedido auxílio em troca da liberdade.
Numa nova estratégia, foi designada a nave do Bravo Capitão Barbosa fazer frente a essas naves invasoras.
O Capitão Barbosa então, numa manobra que fez história, sobrepujou a nave mãe inimiga. Isso é conhecido de todos, o que não se descreve nos livros históricos é o modo como ele conseguiu esse poder, de fato e na verdade — um superpoder elevado ao inverso do poder.
Foi em sua própria nave que aconteceu a coisa. Na ponte de comando, o Tenente Machado invoca o conselho de guerra da nave para preparar um plano de batalha, o clima é tenso pois o Capitão insinua que a batalha já está perdida. A questão gira em volta da mesa. O Contra Mestre Siqueira Campos acusa o Capitão de estar com medo de perder a guerra. O Tenente Machado atravessa em defesa do capitão. As vozes se alteram.
De súbito, um brilho fosforescente reluz do Capitão. Os oficiais de comando contemplam estarrecidos a figura do seu capitão, rígida e catatônica.
O medo havia paralisado a face do capitão, a ideia da batalha o apavorou tanto que ele começou a inverter o curso dessa espera, criando um recuo diametral entre ele e as naves inimigas. O capitão Barbosa usou o seu próprio medo para afugentar o inimigo!
E foi assim que se iniciou o conhecido recuo diametral infinito, onde o paroxismo do medo levou um dos lados a se mover em direção oposta, criando um efeito diametralmente proporcional, de forma que o capitão incógnito da nave alienígena, recebendo o fluxo do terror do implacável Capitão Barbosa, iniciou por sua vez um recuo diametral na mesma proporção.
Foi então que eles quiseram honrar tal nobre inimigo, com uma reprodução aproximada — pois nunca se encontrariam nessa trajetória inversa — do que seria o tal Bravo Capitão Barbosa.
E essa estátua permanece ali com a face voltada para a escuridão interestelar como que a desafiar esses bárbaros conquistadores a não ousarem mais ultrapassar esse perímetro.
E mal sabem eles que o heroico Capitão Barbosa no fundo não foi mais que o maior de todos os covardes.
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Herman Augusto Schmitz (grafados@gmail.com)
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