Parque Jurásico - Michael Crichton - Prólogos Imortais da Ficção Científica

Parque Jurásico

Michael Crichton

Introdução

“O Incidente InGen”

O final do século 20 testemunhou uma corrida do ouro científica de proporções assombrosas: a fúria delirante e desesperada para comercializar produtos da engenharia genética. Essa empreitada realizou-se com tanta rapidez — e tão poucas críticas isentas — que suas dimensões e implicações são praticamente desconhecidas.

A biotecnologia acena com a maior revolução na história da humanidade. Ao final desta década, terá superado os computadores e a energia atômica em termos de efeitos na vida cotidiana. Nas palavras de um estudioso, “a biotecnologia transformará cada aspecto da vida humana: medicina, alimentação, saúde, entretenimento, até mesmo nosso próprio corpo. Vai mudar literalmente a cara do planeta.”

Mas a revolução da biotecnologia difere, em três aspectos importantes, das transformações científicas do passado.

Em primeiro lugar, os Estados Unidos ingressaram na era atômica através do trabalho de um único instituto de pesquisa, em Los Alamos. A entrada na era dos computadores resultou dos esforços de uma dúzia de empresas. Mas a pesquisa biotecnológica atual vem sendo conduzida em mais de dois mil laboratórios, somente naquele país. Quinhentas multinacionais gastam cinco bilhões de dólares por ano nessa área.

Em segundo lugar, grande parte da pesquisa é frívola ou inconseqüente. As tentativas de criar trutas mais claras para permitir melhor visualização na água, árvores quadradas para facilitar o corte de tábuas e células odoríferas injetáveis para que a pessoa recenda para sempre seu perfume favorito podem parecer piadas, mas não são. Na verdade, o fato de a biotecnologia poder ser aplicada a indústrias tradicionalmente sujeitas aos caprichos da moda, como a de cosméticos e as de diversões, aumenta a preocupação quanto ao uso estapafúrdio dessa nova e poderosa tecnologia.

Em terceiro, o trabalho se desenvolve sem controle. Ninguém o supervisiona. As leis federais não o regulam. Não existe preocupação governamental com a questão, nem nos Estados Unidos nem em outras partes do mundo. E, como a aplicação da biotecnologia abrange dos remédios aos produtos agropecuários, passando pela neve artificial, torna-se difícil implantar uma política coerente.

O fato mais alarmante, contudo, é a falta de controle por parte dos próprios cientistas. Vale notar que quase todos dedicados à pesquisa genética estão envolvidos com o comércio da biotecnologia. Não há observadores neutros. Todo mundo tem algum interesse.

A comercialização da biologia molecular é o caso ético mais assombroso da história da ciência, e ocorreu com assustadora velocidade. Por quatrocentos anos, desde Galileu, a ciência comportou-se como uma investigação livre e aberta sobre o funcionamento da natureza. Os cientistas sempre ignoraram fronteiras nacionais, mantendo-se acima dos conceitos transitórios da política e até mesmo da guerra. Sempre se rebelaram contra pesquisas secretas, chegando a recusar a idéia de patentear suas descobertas. Consideravam-se trabalhadores a serviço de toda a humanidade. E, por várias gerações, as descobertas dos cientistas realmente possuíam uma característica peculiar, o desprendimento.

Quando, em 1953, dois jovens pesquisadores da Inglaterra, James Watson e Francis Crick, decifraram a estrutura do DNA, seu trabalho foi saudado como um triunfo do espírito humano, dentro da busca centenária pela compreensão científica do universo. Acreditava-se piamente que a descoberta seria ampliada e utilizada em benefício da humanidade como um todo.

Mas não foi bem isso o que aconteceu. Trinta anos depois, quase todos os colegas cientistas de Watson e Crick encontravam-se comprometidos com um tipo completamente diferente de empreitada. A pesquisa genética molecular tornou-se um projeto comercial gigantesco, multibilionário, datado não de 1953, mas sim de abril de 1976.

Essa foi a época de um encontro que se tornaria famoso, no qual Robert Swanson, um capitalista ousado, abordou Herbert Boyer, bioquímico da Universidade da Califórnia. Os dois homens resolveram fundar uma empresa comercial, para explorar as técnicas de manipulação de genes de Boyer. A nova companhia, Genentech, tornou-se rapidamente a maior e mais bem sucedida das empresas pioneiras de engenharia genética.

Parecia que todo mundo queria ficar rico de repente. Novas empresas surgiam a cada semana, e os cientistas brigavam para participar da pesquisa em genética. Até 1986, pelo menos trezentos e sessenta e dois cientistas, inclusive sessenta e quatro membros da Academia Nacional, assumiram cargos nos conselhos consultivos de indústrias de biotecnologia. O número de cientistas prestando consultoria ou participando de conselhos de acionistas era bem maior.

Torna-se necessário enfatizar o quanto esta mudança de atitude é significativa. No passado, cientistas puros olhavam para os negócios com ar esnobe. Consideravam a busca do lucro pouco interessante intelectualmente, própria para comerciantes. E pesquisar para uma indústria, mesmo em locais de prestígio como os laboratórios da Bell ou IBM, servia apenas para quem não conseguia uma função na universidade. A atitude dos cientistas, portanto, era fundamentalmente crítica em relação à ciência aplicada e à indústria em geral. Esse antagonismo secular manteve os pesquisadores universitários livres da contaminação provocada por laços com a indústria, e sempre que surgia algum debate sobre questões tecnológicas, cientistas desvinculados das indústrias estavam disponíveis para discuti-las em alto nível.

Isso não é mais verdade. Há poucos biólogos moleculares e pouquíssimas instituições de pesquisa sem ligações comerciais. Os bons tempos se foram. A pesquisa genética prossegue, em um ritmo mais alucinado do que nunca. Mas é feita em segredo, às pressas, em função do lucro.

Dentro desse ambiente comercial, talvez seja inevitável o surgimento de uma empresa ambiciosa como a InGen, International Genetic Technologies, Inc., de Paio Alto. Pouco surpreende também que a crise genética por ela criada não tenha sido divulgada. Afinal de contas, a pesquisa da InGen realizou-se em segredo; o incidente propriamente dito ocorreu em uma das áreas mais remotas da América Central; e menos de vinte pessoas o testemunharam. Deste total, apenas um pequeno grupo sobreviveu.

Mesmo no final, quando a International Genetic Technologies baseou seu pedido no Capítulo 11 da lei de falência, dando entrada no Tribunal Federal de Falências em San Francisco, no dia 5 de outubro de 1989, os editais quase não chamaram a atenção da imprensa. Pareciam tão corriqueiros: a InGen era a terceira pequena empresa norte-americana de bioengenharia a fechar naquele ano, e a sétima desde 1986. Poucos documentos do processo vieram a público, uma vez que os credores pertenciam a um consórcio japonês, formado por companhias como a Hamaguri e Densaka, que tradicionalmente evitavam a publicidade. Para impedir revelações desnecessárias, Daniel Ross, da Cowan, Swain e Ross, advogado da InGen, também representou os investidores japoneses. E a petição um tanto inusitada do vice-cônsul da Costa Rica foi transmitida a portas fechadas. Sendo assim, não espanta que, no prazo de um mês, os problemas da InGen tenham sido discreta e cordialmente resolvidos.

Os envolvidos no acordo, inclusive os eminentes conselheiros da junta de consultores científicos, assinaram um termo comprometendo-se a manter total sigilo sobre os fatos, e nenhum deles se dispõe a falar sobre o que aconteceu. Contudo, muitos dos principais protagonistas do “incidente InGen” não assinaram o termo, e aceitaram discutir os notáveis episódios que desembocaram nos dois dias cruciais em agosto de 1989, em uma ilha remota no litoral oeste da Costa Rica.

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A Invasão - Robin Cook - Prólogos Imortais da Ficção Científica

A Invasão

Robin Cook


PRÓLOGO

Nas gélidas vastidões do espaço interestelar, um minúsculo ponto de matéria-antimatéria surgiu do vácuo flutuando, criando um intenso clarão de radiação eletromagnética. Para a retina humana, esses fenômenos teriam parecido a súbita emergência e expansão de um ponto de cores representando todo o espectro de luz visível. Naturalmente, nem os raios gama, os raios X e mesmo os infravermelhos e as ondas de rádio seriam perceptíveis à limitada visão do homem.

Simultaneamente à explosão de cores, a testemunha humana teria visto o surgimento de um número astronômico de átomos, sob a forma de uma concreção negra, disciforme e giratória. O fenômeno pareceria um videoteipe passado em reverso do objeto caindo em um lago cristalino de fluidos, cujas ondulações eram a urdidura do espaço e do tempo.

Ainda viajando próximo à velocidade da luz, o imenso número de átomos aglutinados disparou em direção às distantes regiões do sistema solar, atravessando como um raio as órbitas dos planetas gasosos mais distantes – Netuno, Urano, Saturno e Júpiter. No momento em que a concreção alcançou a órbita de Marte, sua rotação e velocidade haviam desacelerado significativamente.

O objeto podia agora ser visto pelo que era: uma espaçonave intergaláctica cuja superfície externa brilhante assemelhava-se ao ônix extremamente polido. A única irregularidade em seu desenho disciforme era uma série de protuberâncias ao longo da face superior da extremidade da borda. O contorno de cada uma dessas protuberâncias refletia a silhueta da maciça nave-mãe.

Não havia outras distorções em sua superfície: nada de vigias, saídas de ar ou antenas. Não havia nem mesmo linhas de junção estruturais.

Entrando velozmente nas fímbrias da atmosfera terrestre, a temperatura externa da espaçonave elevou-se. Uma cauda flamejante pareceu iluminar o céu noturno no rastro da nave, à medida que os átomos atmosféricos excitados pelo calor desprendiam fótons em protesto.

A nave continuou a desacelerar, tanto em termos de rotação quanto de velocidade. Lá embaixo, as luzes cintilantes de uma cidade desavisada surgiram, sendo, porém ignoradas pela nave pré-programada. Foi por sorte que o impacto ocorreu num espaço árido e rochoso, onde se espalhavam vários penedos. Apesar da velocidade relativamente baixa, o pouso foi mais uma colisão controlada do que uma aterrissagem propriamente dita, lançando pedra, areia e pó em ondas pelo ar. Quando a nave finalmente parou, estava meio enterrada na areia. Os destroços lançados ao ar com o impacto desabaram sobre sua superfície polida.

Depois que a temperatura externa caiu abaixo dos duzentos graus centígrados, uma abertura vertical, semelhante a uma fenda, surgiu ao longo da borda. Aquilo não parecia uma porta mecânica. Era como se as próprias moléculas trabalhassem de comum acordo para permitir que se penetrasse o exterior inconsútil da nave.

A abertura deixou escapar vapor, evidência de que o interior da nave guardava a frigidez do espaço. Lá dentro, uma série de computadores executavam diligentemente sequências automáticas. Amostras da atmosfera e do solo da Terra foram arrastadas para dentro da nave, a fim de serem analisadas. Esses procedimentos automatizados funcionaram como o planejado, inclusive o isolamento de formas de vida procarióticas (bactérias), retiradas do pó. As análises de todas as amostras, inclusive do DNA nelas contido, confirmaram que o destino correto fora alcançado. Teve início então a sequência de aparelhamento. Enquanto isso, uma antena estendeu-se na direção do céu, preparando-se para a transmissão em frequência de quasar, a fim de anunciar que Magnum chegara.

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Tradução de RAQUEL ZAMPIL
Editora Record

E tem outra coisa - Mochileiro das Galáxias (Prólogos Imortais)


E tem outra Coisa

Eoin Colfer

introdução

Até onde sabemos... Um dia, diante de um balde de caranguejos-joias, o Governo Imperial Galáctico decidiu que era necessário construir uma via expressa hiperespacial na região mais brega da Borda Ocidental da Galáxia. Essa decisão passou por cima de vários canais oficiais, com a desculpa de que serviria para impedir engarrafamentos num futuro distante. Na verdade, a finalidade era dar emprego a alguns primos de ministros que viviam de vagabundagem na Praça do Governo. Infelizmente, a Terra estava no caminho dessa via expressa, de modo que os insensíveis vogons foram despachados numa frota de naves de construção para remover o planeta ofensivo com o gentil uso de armas termonucleares.

Dois sobreviventes conseguiram pegar carona na nave vogon: Arthur Dent, um jovem inglês, funcionário de uma estação de rádio local, cujos planos para aquela manhã não incluíam ver seu planeta natal sendo transformado em pó debaixo de suas pantufas. Se a raça humana tivesse feito um plebiscito, Arthur Dent muito provavelmente seria eleito a pessoa menos adequada para carregar as esperanças da humanidade ao espaço. Na verdade, no livro de formatura de Arthur estava escrito que ele “provavelmente vai terminar seus dias num buraco nas montanhas escocesas, tendo apenas sua chatice como companhia”. Por sorte, o amigo betelgeusiano de Arthur, Ford Prefect, um pesquisador de campo do ilustre almanaque de viagens interestelares O Guia do Mochileiro das Galáxias, era mais otimista. Ford via oportunidades de ouro onde Arthur só enxergava nuvens de tempestade, de modo que, unidos, os dois formavam um só viajante espacial prudente — a não ser que suas andanças os levassem ao planeta Junipella onde, literalmente, chovia ouro. Sem dúvida alguma, Arthur teria levado a nave diretamente para a nuvem soturna mais próxima e Ford com certeza tentaria roubar o ouro, o que resultaria na combustão catastrófica do gás natural que havia dentro dela. Isso tudo resultaria numa linda explosão, mas como final heroico careceria de um certo quê, como por exemplo, um herói vivo.

O único outro terráqueo a sobreviver foi Tricia McMillan, ou Trillian, como preferiu ser chamada depois de embarcar para o espaço. Ela era um misto de astrofísica ambiciosa e repórter de primeira viagem que sempre acreditara haver mais coisas na vida do que a vida na Terra. Apesar disso, Trillian ficou pasma quando foi levada para as estrelas por Zaphod Beeblebrox, o rebelde presidente de duas cabeças da Galáxia.

O que se pode dizer de Beeblebrox que ele já não tenha mandado estampar em camisetas oferecidas como brindes a cada compra feita pelo uBid? ZAPHOD DIZ SIM A ZAPHOD foi provavelmente seu slogan mais famoso, mas nem mesmo sua equipe de psiquiatras entendia o que isso queria dizer de verdade. O segundo na preferência geral era: BEEBLEBROX. FIQUE FELIZ POR ELE ESTAR LÁ FORA.

É uma regra aceita universalmente que, se alguém se dá o trabalho de estampar qualquer coisa numa camiseta, ela quase definitivamente não é cem por cento inverídica, o que é o mesmo que falar que tem uma razoável probabilidade de ser um pouco menos do que totalmente não por completo falsa. Assim, quando Zaphod Beeblebrox chegava a um planeta, as pessoas sempre diziam “sim” para ele, e quando ia embora, todos ficavam felizes por ele estar lá fora.

Por uma grande improbabilidade, esses heróis nada tradicionais foram atraídos uns para os outros e embarcaram numa série de aventuras, que em grande parte implicavam vagabundear pelo espaço-tempo, sentando-se em poltronas quânticas, batendo papo com computadores gasosos e geralmente falhando em encontrar algum sentido ou realização em qualquer canto do Universo.

Depois, Arthur Dent acabou retornando ao buraco no Universo onde a Terra costumava ficar, e se surpreendeu ao descobrir que esse buraco fora preenchido por um planeta do tamanho da Terra e que se parecia e agia notavelmente como a Terra. De fato, esse planeta era a Terra, só que não a de Arthur. Pelo menos não desse Arthur especificamente. Como o planeta ocupava o centro de uma Zona Plural, o Arthur que nós conhecemos se viu empurrado pelo eixo dimensional até uma Terra que nunca fora destruída pelos vogons. Isso foi fantástico para o nosso Arthur, e seu humor geralmente pessimista melhorou muito quando conheceu Fenchurch, sua alma gêmea. Por sorte, esse período idílico não foi interrompido por um encontro com qualquer outro Arthur de algum universo alternativo que pudesse estar perambulando por aí, possivelmente trabalhando para a BBC em Los Angeles.

Arthur e seu verdadeiro amor viajaram juntos pelas estrelas até Fenchurch desaparecer no meio de um salto hiperespacial. Arthur revirou o Universo atrás dela, trocando seus fluidos corporais por bilhetes de primeira classe. Durante um tempo, ficou encalhado no planeta Lamuella e passou a ganhar a vida como Fazedor de Sanduíches para uma tribo tão primitiva que ainda acreditava que os sanduíches eram um grande barato.

Sua tranquilidade só foi perturbada com a chegada de uma caixa enviada por Ford Prefect, que continha a segunda versão do Guia do Mochileiro das Galáxias sob a forma de um pássaro pan-dimensional. Trillian, agora uma jornalista bem-sucedida, também tinha mandado uma encomenda para Arthur, sob a forma de Random Dent, uma menina concebida com o que ele havia trocado pelo assento 2D em um voo noturno para Alfa do Centauro.

Com certa relutância, Arthur acabou assumindo o papel de pai, mas ficou totalmente aparvalhado com a adolescente truculenta. Random roubou o Guia versão II e estabeleceu uma rota para a Terra, acreditando que lá poderia finalmente se sentir em casa. Arthur e Ford foram atrás dela e encontraram Trillian já no planeta.

Só então o objetivo do Guia versão II é revelado. Os vogons, irritados com a recusa da Terra em permanecer ca-buuumizada, criaram o pássaro para atrair os fugitivos de volta ao planeta, para depois destruí-lo em todas as dimensões existentes, cumprindo assim a ordem original.

Arthur e Ford correram quase na velocidade da luz até o Clube Beta de Londres, fazendo uma pequena parada para comprar foie gras e sapatos de camurça azul. Graças a toda aquela coisa de eixo dimensional/Zona Plural, eles encontraram Trillian e Tricia McMillan coexistindo no mesmo espaço-tempo, além dos berros de uma agitada Random.

Confuso? Arthur ficou, mas não por muito tempo. Assim que notou os verdes raios da morte cortando a atmosfera, todas as picuinhas do dia, de repente, perderam sua picuinhice. Afinal de contas, a confusão dificilmente o cortaria em milhões de pedacinhos.

Prostetnic Vogon Jeltz fizera seu trabalho magnificamente. Não somente havia atraído Arthur, Ford e Trillian de volta à Terra, como também conseguiu enganar um capitão grebulon, fazendo-o destruir o planeta em seu lugar, poupando a tripulação vogon de ficar várias horas prestando contas ao Departamento de Munições.

Arthur e seus amigos sentaram-se impotentes no Clube Beta e não puderam fazer nada além de observar o ataque definitivo contra a Terra, incapazes de participar — a não ser que espasmos involuntários e liquefação de matéria óssea contem como participação. Desta vez, as armas de destruição eram raios da morte, e não torpedos vogons, mas, que diabo, um instrumento para matar planetas é igual ao outro quando você é o alvo.



 

A Revelação de Rama — Arthur C. Clarke & Gentry Lee (Prólogos Imortais da FC)

A Revelação de Rama

Arthur C. Clarke & Gentry Lee



PRÓLOGO

Em um dos distantes braços espiralados da galáxia da Via-Láctea, uma discreta estrela amarela solitária orbita lentamente o centro galáctico a trinta mil anos-luz de distância. Essa estrela estável, o Sol, leva 225 milhões de anos para completar uma revolução em sua órbita galática. A última vez em que o Sol esteve na sua posição presente, répteis gigantescos de poderes assustadores tinham começado a estabelecer seu domínio na Terra, um pequeno planeta azul que é um dos satélites do Sol.

Dentre os planetas e outros corpos da família do Sol, foi apenas nessa Terra que se desenvolveu algum tipo de vida complexa e duradoura. Apenas nesse mundo especial as substâncias químicas evoluíram até uma consciência e então perguntaram, quando começaram a compreender as maravilhas e dimensões do universo, se milagres semelhantes àqueles que as criaram teriam acontecido em alguma outra parte.

Afinal de contas, argumentavam essas sensíveis criaturas terrestres, há cem bilhões de estrelas somente na nossa galáxia. Estamos bem certas de que pelo menos vinte por cento dessas estrelas têm planetas em suas órbitas, e que um número pequeno mas significativo desses planetas teve, em alguma época de sua história, condições atmosféricas e térmicas capazes de formar aminoácidos e outras substâncias químicas orgânicas que são o sine qua non de qualquer biologia que podemos imaginar. Pelo menos uma vez na história, aqui na Terra, esses aminoácidos descobriram a auto-replicação, e o milagre da evolução que veio a produzir os seres humanos foi posto em movimento. Como podemos presumir que essa seqüência ocorreu apenas naquela única vez em toda a história? Os átomos mais pesados necessários para a nossa criação foram forjados nos cataclismos estelares que explodiram por todo esse universo durante bilhões de anos. É provável que somente aqui, neste único lugar, esses átomos tenham se concatenado em moléculas especiais e evoluído para um ser inteligente capaz de fazer a pergunta: “Estamos sozinhos?”

Na sua busca por seus companheiros cósmicos, de início os seres terrestres construíram telescópios que lhes permitissem ver seus vizinhos planetários imediatos. Mais tarde, quando sua tecnologia atingiu um nível mais avançado, sofisticadas espaçonaves robóticas foram enviadas para examinar esses outros planetas e verificar se neles havia ou não algum sinal de vida. Através dessas explorações, constatou-se que não havia qualquer tipo de vida inteligente em nenhum outro corpo de nosso sistema solar. Se houver alguém por lá, concluíram os cientistas humanos, alguma espécie semelhante à nossa com a qual pudéssemos nos comunicar, deve estar além do vazio que separa nosso sistema solar de todas as outras estrelas.

No final do século 20 do sistema humano de tempo, as grandes antenas da Terra começam a procurar sinais coerentes no céu, a fim de determinar se por acaso alguma outra inteligência estaria nos enviando uma mensagem de rádio. Essa busca continuou por mais de cem anos, tendo se intensificado durante os dias fulgurantes da ciência internacional no início do século 21, e diminuído mais tarde, nas últimas décadas do século, depois que o quarto conjunto sucessivo de técnicas sistemáticas de escuta não conseguiu localizar nenhum sinal alienígena.

Por volta do ano 2130, quando o estranho objeto cilíndrico foi identificado pela primeira vez vindo do espaço interestelar na direção do nosso sistema solar, a maioria dos seres humanos pensantes concluíra que a vida devia ser escassa no universo e que a inteligência, se é que jamais existiu fora da Terra, era excessivamente rara. De que outra forma, diziam os cientistas, poderíamos explicar a falta de resultados positivos em toda a nossa cuidadosa busca extraterrestre durante o século passado?

Portanto, todos na Terra se assombraram quando, depois de uma inspeção minuciosa, o objeto que entrou no nosso sistema solar em 2130 foi considerado, incontestavelmente, um artefato de origem alienígena. Era uma prova inegável de que existia uma inteligência avançada, ou pelo menos tinha existido em alguma época anterior, em outra parte do universo. Quando uma missão espacial foi desviada para encontrar-se com o pardacento gigante cilíndrico, com dimensões maiores que as maiores cidades da Terra, os pesquisadores cosmonautas encontraram um mistério atrás do outro. Mas eles não foram capazes de responder a algumas das questões mais fundamentais sobre a enigmática espaçonave alienígena. O intruso objeto proveniente das estrelas não fornecia explicações definitivas sobre sua origem ou finalidade.

Aquele primeiro grupo de exploradores humanos não só catalogou as maravilhas de Rama (nome dado ao gigantesco objeto cilíndrico antes de se saber que era um artefato extraterrestre), mas também explorou e mapeou seu interior. Depois que o grupo de exploração deixou Rama e a espaçonave alienígena desapareceu em volta do Sol, saindo do sistema solar em velocidade hiperbólica, os cientistas analisaram detalhadamente todos os dados coletados durante a missão. Todos reconheceram que os visitantes humanos de Rama não tinham encontrado as verdadeiras criaturas da misteriosa espaçonave. Contudo, a cuidadosa análise realizada depois da sua passagem revelou um princípio imutável de sua redundante engenharia. Cada sistema principal e cada subsistema do veículo tinham duas cópias. Os navegantes de Rama projetavam tudo em triplos. Os cientistas concluíram que era muito provável que em breve surgiriam duas outras espaçonaves semelhantes.

Os anos que se seguiram imediatamente à visita de Rama I, em 2130, foram anos de expectativa na Terra. Estudiosos e políticos proclamavam que uma nova era da história humana havia começado. A Agência Espacial Internacional (ISA), trabalhando em cooperação com o Conselho de Governos (COG), criou cuidadosos procedimentos a serem utilizados na próxima visita dos ramaianos. Todos os telescópios foram voltados para os céus, competindo entre si pela aclamação que receberia o indivíduo ou o observatório que primeiro localizasse a próxima espaçonave Rama. Mas não houve outra aparição.

Na segunda metade da década de 2130, o boom econômico, cujos últimos estágios foram, em parte, alimentados pelas reações internacionais a Rama, terminou abruptamente. O mundo mergulhou na maior depressão de sua história, conhecida como o grande caos, que gerou a anarquia e a miséria por toda parte. Todas as pesquisas científicas foram abandonadas durante essa triste era, e, depois de várias décadas de atenção aos problemas do mundo, o povo da Terra quase se esqueceu do inexplicável visitante das estrelas.

Em 2200, um segundo intruso cilíndrico chegou no sistema solar. Os cidadãos da Terra tiraram a poeira dos antigos procedimentos desenvolvidos depois da partida da primeira Rama e prepararam-se para o encontro com Rama II. Foi escolhida para a missão uma tripulação com doze integrantes. Logo depois do encontro, os doze declararam que a segunda espaçonave Rama era quase idêntica à anterior. Os humanos encontraram novos mistérios e maravilhas, inclusive alguns seres alienígenas, mas continuaram incapazes de responder às questões sobre a origem e finalidade de Rama.

Três mortes estranhas entre os tripulantes criaram uma grande preocupação na Terra, onde todos os aspectos da missão histórica foram assistidos pela televisão. Quando o gigantesco cilindro realizou uma manobra de meio curso, colocando-se na trajetória que impactaria a Terra, todos ficaram alarmados e apavorados. Os líderes mundiais concluíram com relutância que, na ausência de qualquer outra informação, não tinham escolha a não ser, concluir que Rama II era hostil. Não podiam permitir que uma espaçonave alienígena se chocasse com a Terra, ou se aproximasse o suficiente para utilizar as armas que devia possuir. Tomaram a decisão de destruir Rama II enquanto ela ainda se encontrava a uma distância segura da Terra.

A equipe de exploração teve ordem de voltar, mas três de seus membros, dois homens e uma mulher, ainda se encontravam a bordo de Rama II quando a espaçonave alienígena desviou-se da falange nuclear enviada da Terra. Rama afastou-se da Terra hostil e partiu em alta velocidade do sistema solar, carregando seus segredos intactos e três passageiros humanos.

Foram necessários treze anos de velocidades relativísticas para que Rama II viajasse da vizinhança da Terra até seu destino, um imenso complexo de engenharia chamado Nodo, localizado em uma órbita distante em torno da estrela Sírius.

Os três humanos a bordo do gigantesco cilindro tiveram cinco filhos e tornaram-se uma família. Enquanto investigava as maravilhas de sua casa espacial, a família encontrou-se de novo com as espécies extraterrestres que tinha visto anteriormente. Porém, quando chegaram a Nodo, os humanos já haviam se convencido de que aqueles outros alienígenas eram, como eles, passageiros de Rama.

A família humana permaneceu em Nodo durante pouco mais de um ano. Durante esse tempo, a espaçonave Rama foi remodelada e preparada para a sua terceira e última viagem ao sistema solar. A família soube pela Águia, uma criação não-biológica da Inteligência Nodal, que o objetivo das espaçonaves Rama era adquirir e catalogar o máximo possível de informações sobre passageiros espaciais na galáxia. A Águia, com cabeça, bico e olhos de uma águia e corpo humano, informou também que a última espaçonave, Rama III, conteria um habitat cuidadosamente projetado com capacidade para duas mil pessoas.

Um vídeo foi transmitido de Nodo para a Terra, anunciando a volta iminente da terceira espaçonave Rama. Esse vídeo explicava que uma elaborada espécie extraterrestre desejava observar e estudar as atividades humanas durante um longo período, e solicitava que dois mil representantes humanos fossem enviados ao encontro de Rama III na órbita de Marte.

Rama III realizou a viagem de Sírius para o sistema solar em uma velocidade correspondente a mais da metade da velocidade da luz. No interior da espaçonave, dormindo em beliches especiais, encontrava-se grande parte da família humana que tinha estado em Nodo. Na órbita de Marte, essa família acolheu os outros humanos da Terra e o habitat primitivo no interior de Rama foi rapidamente organizado. A colônia resultante, chamada Novo Éden, foi completamente encerrada e isolada do restante da espaçonave alienígena por meio de grossas paredes.

Quase imediatamente, Rama III acelerou de novo a velocidades relativísticas, deslocando-se para fora do sistema solar na direção da estrela amarela Tau Ceti. Três anos se passaram sem qualquer interferência externa na vida dos humanos. Os cidadãos do Novo Éden tornaram-se tão envolvidos em sua vida diária que mal prestavam atenção ao universo fora de sua colônia.

Quando uma série de crises se abateu sobre a frágil democracia do paraíso criado para os humanos pelos ramaianos, um líder oportunista subiu ao poder na colônia e começou a suprimir impiedosamente toda e qualquer oposição. Um dos exploradores originais de Rama II fugiu do Novo Éden nessa ocasião, e acabou fazendo contato com um casal simbiótico de uma espécie alienígena que vivia encerrado no habitat adjacente. Sua esposa permaneceu na colônia humana e tentou em vão conscientizar a comunidade, mas foi aprisionada depois de alguns meses, condenada por traição, e sua execução foi marcada.

Enquanto as condições ambientais e de vida dentro do Novo Éden continuavam a se deteriorar, tropas humanas invadiram a área adjacente ao Hemicilindro Norte da espaçonave Rama, e entregaram-se a uma guerra de aniquilamento contra o casal simbiótico de espécie alienígena. Nesse meio-tempo, os misteriosos ramaianos, conhecidos somente através de suas geniais criações de engenharia, continuaram sua observação detalhada a distância, certos de que dentro de pouco tempo os humanos entrariam em contato com a avançada espécie que vivia na região ao sul do mar Cilíndrico...

3001 A Odisséia Final — Arthur C. Clarke (Prólogo)

3001: A Odisséia Final

Arthur C. Clarke




Prólogo : Os Primogênitos

Vamos chamá-los de Primogênitos. Embora não fossem nem remotamente humanos, eram de carne e osso e, quando fitavam as profundezas do espaço, sentiam reverência e assombro — assim como solidão. Tão logo lhes foi possível, começaram a procurar companhia entre as estrelas.

Em suas explorações, depararam com a vida sob muitas formas e observaram o funcionamento da evolução em mil mundos. Viram com que freqüência os primeiros e tênues lampejos de inteligência cintilavam e morriam na noite cósmica.

E como, em toda a Galáxia, não descobriram nada mais precioso do que a Mente, incentivaram seu alvorecer por toda parte. Tornaram-se lavradores nos campos de estrelas; semearam e, vez por outra, colheram.

E ocasionalmente, de um modo desapaixonado, tiveram de ceifar as ervas daninhas.

Fazia muito tempo que os grandes dinossauros haviam desaparecido, com sua promessa de futuro aniquilada por uma martelada aleatória vinda do espaço, quando a nave de inspeção penetrou no Sistema Solar, após uma viagem que já durava mil anos. Ela passou velozmente pelos planetas externos congelados, fez uma breve pausa acima dos desertos de Marte agonizante e, por fim, olhou a Terra lá embaixo.

Estendendo-se abaixo deles, os exploradores viram um mundo fervilhante de vida. Durante anos, estudaram, coletaram, catalogaram. Depois de aprenderem tudo o que podiam, começaram a fazer mudanças. Brincaram com o destino de muitas espécies, na terra e nos mares. Mas qual de seus experimentos daria frutos, isso eles só saberiam dentro de um milênio.

Eles eram pacientes, mas ainda não imortais. Havia muito que fazer naquele universo de um bilhão de sóis e outros mundos os chamavam. Assim, partiram mais uma vez para o abismo, sabendo que nunca mais tornariam a passar por ali. Nem era preciso: os criados que eles tinham deixado se encarregariam do resto.

Na Terra, as glaciações vieram e se foram, enquanto, pairando acima delas, a Lua imutável continuava a guardar seu segredo vindo das estrelas. Num ritmo ainda mais lento que o do gelo polar, as marés de civilização subiram e fluíram por toda a Galáxia. Impérios estranhos, belos e terríveis tiveram sua ascensão e queda e transmitiram seu saber a seus sucessores.

E agora, lá em meio às estrelas, a evolução rumava para novas conquistas. Fazia muito que os primeiros exploradores da Terra haviam atingido os limites da carne e osso; tão logo suas máquinas ficaram melhores do que seus corpos, chegou a hora de mudar. Primeiro transferiram seus cérebros, e depois apenas seus pensamentos, para novas e reluzentes moradias de metal e pedras preciosas. Nestas percorreram a Galáxia. Já não construíam naves espaciais. Eles eram as naves espaciais.

Mas a era das Entidades Mecânicas passou depressa. Em sua experimentação incessante, eles haviam aprendido a armazenar conhecimentos na estrutura do próprio espaço e a preservar suas idéias por toda a eternidade em arranjos de luz congelados.

Em pura energia, portanto, acabaram se transformando; e em milhares de mundos, as conchas vazias que eles haviam descartado contorceram-se por algum tempo, numa negligente dança da morte, até se desfazerem em pó.

Agora, eles eram os Senhores da Galáxia e podiam vaguear à vontade por entre as estrelas, ou mergulhar qual bruma sutil pelos próprios interstícios do espaço. Embora estivessem finalmente livres da tirania da matéria, não haviam esquecido por completo suas origens no limo tépido de um mar desaparecido. E seus instrumentos maravilhosos ainda continuavam a funcionar, vigiando os experimentos iniciados tantas eras antes.

Mas estes já nem sempre obedeciam às ordens de seus criadores; como todas as coisas materiais, não eram imunes à corrupção do Tempo e de sua serva paciente e insone, a Entropia.

E, vez por outra, descobriam e iam em busca de seus próprios objetivos.

2001 Odisséia no Espaço — Arthur C. Clarke (Prólogo)

2001: Odisséia no Espaço

Arthur C. Clarke



Prólogo

Erguem-se trinta fantasmas atrás de cada homem vivo. É esta precisamente a proporção entre os que ainda vivem e os que já morreram. Cerca de cem bilhões de criaturas humanas já pisaram o planeta Terra desde que o mundo existe.

É uma cifra interessante, pois, por coincidência, há aproximadamente cem bilhões de estrelas nesse universo particular, a via-láctea. Portanto, para cada homem que viveu corresponde uma estrela em pleno brilho.

Mas cada uma dessas estrelas é um sol, frequentemente muito mais brilhante e resplandecente do que a pequenina e vizinha estrela a que chamamos Sol. É em torno de muitos deles, da maioria, talvez, desses sóis desconhecidos, que giram os planetas. É quase certo assim haver no céu terra suficiente para proporcionar a cada membro da espécie humana, incluindo o homem-macaco, o seu paraíso — ou inferno — particular, do tamanho do mundo.

É impossível saber quantos desses paraísos ou infernos em potencial são habitados e por que espécie de criaturas o são. O mais próximo deles está situado um milhão de vezes mais longe que Marte ou Vênus, essas metas ainda remotas para a próxima geração. Mas as barreiras dessa distância desmoronam. Chegará o dia em que haveremos de encontrar entre as estrelas os nossos semelhantes — ou os nossos mestres.

Os homens custaram a enfrentar essa perspectiva. Alguns ainda continuam esperando que ela nunca se torne realidade. Entretanto, cada vez é mais freqüente a pergunta: Não será possível que já tenham acontecido tais encontros, visto nós mesmos estarmos prestes a aventurar-nos ao espaço?

Por que não? Este livro bem pode ser uma resposta para pergunta tão razoável. Mas, por favor, lembrem-se de que é ele apenas ficção.

A verdade, como sempre, será muitíssimo mais estranha.


 A.C.C.

 S.K


Os Robinsons do Cosmos — Francis Carsac (Prólogo)

Os Robinsons do Cosmos

Francis Carsac



PRÓLOGO

Não vou contar aqui a história do cataclismo, nem a da conquista de Tellus, a qual podereis achá-la detalhadamente estudada nas obras da minha irmã. Eu quero simplesmente contar minha própria vida. Todos vocês, descendentes meus ou dos meus companheiros, que habitais este mundo, por direito de nascimento, gostarão, com certeza, de conhecer as impressões e lutas de um homem, nascido em outro planeta, que foi transportado para cá por um fenômeno sem precedentes, embora mal explicado, e que quase perdeu a esperança antes de compreender a magnífica aventura que se lhe oferecia.

Para que escrever este livro? Sem dúvidas não vais lê-lo todo. Já conheceis o essencial. Escrevo principalmente para o futuro. Recordo que naquela Terra que desconheceis, e que jaz em algum rincão ignoto do espaço, a curiosidade dos historiadores se centrava no testemunho de tempos remotos. Quando tiverem transcorridos quinhentos ou seiscentos anos, este livro terá o interesse de ser o relato de uma testemunha ocular do Grande Começo.

Na época em que inicio esta narração, eu não era este ancião encovado e um pouco chocho que sou agora. Tinha então vinte e três anos.

Fazem sessenta anos. Sessenta anos que passaram como um suspiro. Sei que estou perdendo minhas faculdades: meus movimentos não têm a precisão de antes, me canso rápido e poucas coisas me atraem: meus filhos e meus netos, ainda gosto também de um pouco de geologia e tomar sol, ou melhor, sois, já que temos dois. Tenho pressa, portanto, em ditar ao meu neto Pierre – minhas mãos tremem demasiado e me impedem de escrever - a história insubstituível e única de um destino humano. Me ajuda o diário escrito durante minha vida e que destruirei ao acabar esta tarefa. Acho que falarei sobre tudo que tenha interesse. Por outro lado, não queria frustrar a curiosidade, às vezes um pouco sádica, dos historiadores, sobre o que foram minhas modestas alegrias e minhas penas.

Ao ditar, contemplo pela janela como ondula o trigo sob o vento, e me parece por um momento, estar de volta à minha Terra natal, até que me dou conta de que as árvores têm duas sombras...

Flashback: Duas vidas em rota de colisão — Samuel Cardeal (Prólogo)

Flashback: Duas vidas em rota de colisão

Samuel Cardeal


PRÓLOGO — 

Onde estou?

O que está acontecendo?!

Não sei que lugar é esse, nem como vim parar aqui. Meus olhos se acostumam com o novo cenário, voltando ao foco natural. Em frente a mim, depois de um amplo painel de vidro, algumas pessoas assistem o que quer que esteja acontecendo comigo. Semblantes sérios na sua maioria, apreensivos, eu diria.

Sinto minhas mãos presas, não consigo sair do lugar. Observo com maior atenção os meus dedos tremelicantes e percebo que minha pele está mais escura, negra. Meus dedos também não são tão grossos quanto os atuais. Sinto meu corpo preso a uma cadeira, tiras de couro cerceiam todos os meus movimentos. Percebo que, assim como meus dedos, meu corpo está diferente, maior, mais robusto; não sinto a minha magreleza de sempre.

Há um burburinho no ar, várias vozes que eu não conheço conversando aos sussurros coisas que eu não consigo entender. De repente, dois homens fardados passam à minha frente. Um deles carrega um balde; o outro, uma esponja amarelada e velha. O sujeito da esponja mergulha o objeto no balde e ele retorna ensopado. Olhando para mim de uma forma doentia e maldosa, o homem coloca a esponja sobre minha cabeça, que acabo de perceber estar raspada.

Assim que aquele objeto molhado toca minha cabeça, a água começa a escorrer pelo meu rosto. Algumas gotas entram em minha boca e sinto um gosto salgado. Logo em seguida, o homem que carregava o balde sai do meu campo de visão e retorna com um objeto estranho, um tipo de mini-capacete com correias de metal. Enquanto o sujeito da esponja segura meu rosto, o outro coloca aquela coisa em mim, prendendo as correias sob meu queixo e apertando a pele do meu rosto sem o mínimo sinal de delicadeza.

Os dois homens se afastam, um deles se posta ao meu lado, de modo que consigo vê-lo com minha visão periférica. O outro eu não vejo. Sinto um desespero enorme enquanto tento me livrar das amarras que me prendem àquela lúgubre cadeira. Então eu paro, congelo de uma forma inexplicável, assim que o homem fardado ao meu lado começa a falar:

— Senhor Martin Malcolm Silva, de acordo com a lei federal, e conforme decisão de um tribunal do júri legalmente constituído, você será executado na presente data. A eletricidade passará pelo seu corpo até que seu coração pare e seu organismo não mais funcione. Deus tenha piedade de sua alma

O homem termina de falar e assente com a cabeça para alguém atrás de mim. Em seguida um ruído de eletricidade invade meus ouvidos violentamente. As luzes piscam e meu coração dispara de forma vertiginosa.

Eu não entendo o que tudo isso significa. Eu fui condenado à morte; mas eu não sou “eu”! E o que “eu” fiz para ser condenado? Agora sei que aquelas pessoas além do vidro estão aqui para me assistirem morrer. A eletricidade passará pelo seu corpo até que seu coração pare, ele disse. Mas não quero que meu coração pare!

Um homem vestindo um terno preto com um colarinho estranho se aproxima de mim. Diferente dos fardados, traz um semblante sereno, amigável. Eu quase me sinto bem ao olhá-lo nos olhos; dois olhos azuis apagados, com cataratas a lhe roubar a cor, emoldurados por uma pele enrugada, fustigada pelo tempo. Segurando um livro grosso de capa preta, ele coloca a mão sobre o meu ombro e diz:

— Deseja fazer uma última declaração, filho? — ele pergunta.

Eu não sei o que dizer. Nem mesmo sei o que está de fato acontecendo, e por que está acontecendo. A confusão toma conta de todo o meu ser, sinto vontade de chorar, e perpetuo o desejo deixando verter lágrimas encorpadas que se empossam abaixo dos meus olhos, sobre olheiras protuberantes que sinto arderem.

Minha cabeça dói; minha boca seca tem um gosto rançoso, amargo. Não sei como, nem por que, mas três palavras se repetem em minha mente, e algo indescritível e inexplicável me diz que devo proferi-las. Sem saber o que fazer, nem o que pensar, deixo que aquela sensação guie meus atos e liberto as palavras que pedem para serem ditas.

— Eu sou INOCENTE!

A luz se apaga.

Orador dos Mortos — Orson Scott Card (Prólogo)

Orador dos Mortos

Orson Scott Card


Prólogo

Em 1830, depois da elaboração do Código Estelar, uma nave-robô de reconhecimento enviou um relatório por ansible: o planeta que estava investigando estava bem dentro dos parâmetros da vida humana. O planeta Bahia, ao qual o Congresso Estelar concedera licença para exploração, era o mais próximo com explosão demográfica.

Assim, os primeiros humanos a verem o novo mundo falavam português, tinham cultura brasileira, e eram católicos. Em 1886 CE, eles desembarcaram de um ônibus espacial, persignaram-se e batizaram o planeta de Lusitânia — o antigo nome de Portugal. Passaram a catalogar a flora e a fauna. Cinco dias depois, perceberam que os pequenos animais da floresta — que chamaram de porquinhos — não eram absolutamente irracionais.

Pela primeira vez desde o Xenocídio dos Insecta pelo monstruoso Ender, os humanos encontravam vida alienígena inteligente. Tecnologicamente, os porquinhos eram primitivos, mas usavam ferramentas, construíam casas e falavam.

— É outra chance que Deus nos deu, — declarou o arcecardeal Pio, de Bahia. — Poderemos nos redimir pela destruição dos insecta.

Os membros do Congresso Estelar veneravam muitos deuses — ou nenhum —, mas concordaram com o arcecardeal. Lusitânia seria povoada a partir de Bahia e, portanto, sob licença católica, como exigia a tradição, mas a colônia não poderia propagar-se além de uma região delimitada nem sua população exceder determinado número. Também estava sujeita, acima de tudo, a uma lei: não devia perturbar os porquinhos.

O Homem Ilustrado — Ray Bradbury (Prólogo)

O Homem Ilustrado

Ray Bradbury


PRÓLOGO

Foi por uma tarde quente de princípios de Setembro que encontrei, pela primeira vez, o Homem Ilustrado. Percorria a última etapa de uma viagem a pé, de quinze dias, pelo Wisconsin. Ao cair da noite parei para comer alguma carne de porco com feijões e um biscoito. Preparava-me para me estender a ler quando o Homem Ilustrado surgiu no alto da colina e ficou um momento imóvel, a silhueta recortada contra o céu.

Ignorava, nesse momento, que ele estava Ilustrado. Reparei, unicamente, que era alto, que outrora fora bem musculado mas, agora, por qualquer razão, tinha tendência para engordar. Lembro-me que possuía uns braços longos e umas mãos grossas, mas o rosto, no alto do corpo maciço, era como o de uma criança.

Pareceu pressentir a minha presença, pois não me olhou quando pronunciou as primeiras palavras: — Sabe onde poderei encontrar trabalho?

— Lamento, mas não sei — respondi.

— Ainda não consegui um emprego durável nestes últimos quarenta anos.

Fazia calor. No entanto, o colarinho da sua camisa de lã estava abotoado e as mangas fechadas em redor dos grossos punhos. O suor corria-lhe pelo rosto, mas não abria a camisa.

— Bem — disse ele, finalmente —, este sítio é tão bom como qualquer outro para passar a noite. Importa-se que lhe faça companhia?

— Tenho ainda alguma comida que gostaria de repartir consigo — ofereci eu.

Sentou-se pesadamente, resmungando.

— Vai arrepender-se de me pedir para ficar. Toda a gente se arrepende. É por causa disso que não paro. Estamos em princípios de Setembro, a melhor época para divertimentos. Ganharia montões de ouro numa feira de qualquer pequena cidade. Mas estou aqui, sem qualquer contrato.

Descalçou um enorme sapato e examinou-o de perto.

— Geralmente, aguento-me num emprego dez dias. Depois, acontece sempre a mesma coisa e despedem-me. Nesta altura, em nenhuma feira da América me quereriam tocar, nem sequer com a ponta de uma vara.

— Mas o que é que se passa consigo?

Como resposta, desabotoou lentamente o apertado colarinho. Com os olhos fechados, abriu a camisa e, com a ponta dos dedos, tateou o peito.

— É curioso — observou ele —. Não se podem sentir, mas a verdade é que estão cá. Tenho sempre a esperança de que um dia desaparecerão. Durante horas seguidas caminho ao Sol, sob o mais escaldante calor, queimo-me, na esperança que o suor as faça desaparecer, que o Sol as derreta; mas a noite ainda cá estão.

Voltando ligeiramente a cabeça na minha direção, mostrou-me o peito.

— Ainda estão aqui. As Ilustrações.

— Uma outra razão por que conservo o colarinho abotoado são as crianças — disse ele, abrindo os olhos —. Perseguem-me pelos caminhos, pelos campos. Querem ver as imagens e, todavia, ninguém, a não ser elas, tem curiosidade nisso.

Despiu a camisa e torceu-a. Estava coberto de imagens, desde o anel tatuado, à volta do pescoço, até a cintura.

— E isto continua — prosseguiu ele, adivinhando o meu pensamento. — Sou inteiramente ilustrado. Veja!

Abriu a mão. Na palma havia uma rosa — tinha acabado de ser colhida e nas delicadas pétalas via-se ainda orvalho cristalino. Estendi o dedo para tocá-la, mas era uma imagem!

Quanto ao resto de seu corpo... Não poderei explicar como fiquei ali com os olhos esgazeados. Era um turbilhão de astronaves, fontes e gentes, com tão entrelaçados pormenores e cores que se podiam ouvir os murmúrios e as vozes abafadas das multidões que habitavam aquele corpo. Quando estremecia, as pequenas bocas animavam-se, os minúsculos olhos verdes ou dourados moviam-se, as pequenas e rosadas mãos agitavam-se. Havia prados amarelos, rios azuis, montanhas, estrelas, sóis e planetas, dispersos numa Via-Láctea que lhe descia pelo peito. As figuras estavam dispersas, em grupos de vinte ou trinta, nos braços, nas espáduas, no dorso, nos flancos, nos punhos, no plexo solar. Havia-as, também, numa floresta de pêlos, escondidas entre uma constelação de sardas, espiando do fundo das cavernosas axilas, os olhos faiscando como diamantes. Cada grupo parecia ter uma atividade própria; cada um era constituído por uma galeria diferente de figuras.

— São belas! — exclamei.

Como descrevê-las? Se Greco, no auge do talento, tivesse pintado miniaturas não maiores que a mão, com as suas cores sulfurosas, com a sua morfologia especial, a anatomia alongada, talvez tivesse aproveitado o corpo deste homem para a sua obra. As cores brilhavam em três dimensões. Pareciam janelas abertas sobre uma realidade exuberante. Aí, reunidas como numa parede, recortavam-se as cenas mais extraordinárias do Universo. Este homem era um museu ambulante. Não era o trabalho tricromado de um tatuador de feira, de hálito avinhado; era a obra-prima inspirada, vibrante, límpida e bela de um gênio.

— Oh, sim! — disse o Homem Ilustrado. — Sou tão orgulhoso das minhas ilustrações que até gostaria de lhes lançar fogo. Já tentei o esmeril, o ácido, a navalha...

O Sol escondia-se. A Lua, a Oriente, estava já alta.

— Porque, veja — continuou o Homem Ilustrado —, estas ilustrações predizem o futuro.

Olhei-o em silêncio.

— Durante o dia, ainda vá — prosseguiu ele —, posso arranjar trabalho por umas horas. Mas à noite, elas movem-se. As imagens ganham vida própria.

Creio que sorri.

— Desde quando está ilustrado?

— Em 1900, tinha eu vinte anos, trabalhava numa feira e parti uma perna.

O acidente imobilizou-me. Tinha de arranjar trabalho para me manter. Então decidi fazer-me tatuar.

— Mas quem o tatuou? O que aconteceu ao artista?

— Ela voltou para o futuro... É exatamente isso que quero dizer. Uma velha mulher, numa casinha algures no Wisconsin, em algum sítio não longe daqui. Uma velha e pequena feiticeira que tinha o ar de ter mil anos em certos momentos e vinte no instante imediato. Mas afirmou-me que se podia deslocar no tempo. Ri-me. Mas já não o faço agora!

— Como a encontrou?

Relatou-me, então, a história. Tinha visto na berma de uma estrada uma tabuleta pintada: “Ilustrações sobre a pele!” Ilustrações e não tatuagens! Foi no decorrer de uma noite que as agulhas mágicas da mulher o morderam como vespas, o picaram como abelhas, o sugaram como sanguessugas. Chegada a manhã, tinha o aspecto de um homem que tivesse passado sob uma prensa polícroma, muito liso, multicolor, cintilante.

— Procurei-a todos os Verões, durante cinquenta anos — terminou ele, estendendo os braços. — Quando encontrar a feiticeira, matá-la-ei!

O Sol desaparecera. As primeiras estrelas brilhavam no firmamento e a Lua iluminava os campos de trigo e os prados. As imagens do Homem Ilustrado brilhavam como carvões, na penumbra, como rubis e esmeraldas, com as cores das telas de Van Gogh, de Klee e os corpos alongados de Greco.

— Quando as imagens se movem, as pessoas mandam-me embora.

Ninguém gosta de as ver, tanto mais que nas minhas ilustrações se passam coisas espantosas. Cada uma delas é uma historinha. Se as observar, elas contarão, em poucos minutos, uma história. Em três horas verá desenrolar-se uma vintena de histórias sobre o meu corpo. Poderá ouvir vozes, perceber pensamentos. Tudo está aí, basta que olhe. Mas há, sobretudo, um certo local...

Mostrou-me o dorso.

— Está a ver? Não há um único desenho regular na espádua direita. Está tudo misturado. — Realmente, assim é!...

— Sempre que estou muito tempo com alguém, esta zona cobre-se de sombras, depois aparece isso. Se estou com uma mulher, a sua imagem surge ao fim de uma hora no meu dorso, e ela vê aí retratada toda a sua vida: como vai viver, como morrerá, como terá o rosto aos sessenta anos. E se é um homem, a imagem surge no meu dorso ao fim do mesmo tempo. Pode ver-se caído de uma falésia ou esmagado por um comboio. Então, mandam-me de novo embora.

Enquanto falava percorria as mãos pelas ilustrações, como para ajeitar as molduras, limpar-lhes o pó, num gesto de conhecedor, de amador de arte. Estava agora estendido ao comprido, sob o luar. A noite estava quente, sufocante até, sem uma aragem. Tínhamos despido a camisa.

— E nunca mais encontrou essa mulher?

— Nunca mais!

— Acredita que ela veio do futuro?

— Se assim não fosse, como poderia conhecer as histórias que pintou no meu corpo?

Cerrou os olhos, fatigado. A sua voz tornou-se menos distinta.

— Por vezes, durante a noite, sinto-as moverem-se como formigas sobre o corpo. Sei, então, que fazem o que têm a fazer. Nunca as olho. Tento, somente, ter algum repouso, porque durmo pouco. Não as olhe também, previno-o. Volte-se para o outro lado para dormir.

Deitei-me a alguma distância. O homem não me parecia capaz de violência e as imagens eram muito belas. Se não fosse isso ter-me-ia retirado, acabando com a conversa. Mas as ilustrações...

Deixei os olhos percorrê-las. Quem quer que fosse ficaria meio doido se tivesse isto sobre o corpo.

A noite estava serena. Podia ouvir o Homem Ilustrado respirar, banhado pelo luar. Ao longe, os grilos trilavam suavemente nas ravinas. Deitei-me de lado para observar as imagens. Decorreu talvez uma meia hora. Não poderia dizer se o Homem Ilustrado dormia, mas, de repente, ouvi-o dizer num murmúrio: — Estão a mover-se, não é verdade?

Esperei um momento. Depois respondi: — Sim, agitam-se.

As imagens animavam-se, cada uma por sua vez, durante um ou dois minutos. Ali, sob a Lua, com breves pensamentos, que vibravam, e vozes distantes como as do mar, vi desenrolar-se cada um daqueles pequenos dramas. Uma hora, duas horas, até quando? Será difícil dizê-lo. Sei somente que fiquei ali, fascinado, sem me mexer, sob as estrelas que brilhavam no Céu.

Dezoito ilustrações. Dezoito histórias. Contei-as uma a uma.

Fixei os olhos numa cena: uma grande casa com duas figuras no interior.

Vi o voo de abutres num céu tórrido e leões. E ouvi vozes.

A primeira imagem estremeceu e animou-se. 

O que é um prólogo? O prólogo é uma introdução presente em algumas obras literárias, frequentemente escrita pelo autor ou por uma terceira pessoa, que oferece ao leitor uma contextualização antes do início da narrativa principal. Ele pode esclarecer elementos importantes, como informações de fundo sobre os personagens, o cenário, ou a trama, preparando o leitor para a história que está por vir. Além disso, o prólogo pode explorar temas ou questões que serão centrais ao longo do livro, criando uma ponte entre o leitor e o universo ficcional da obra.

Filhos do Fim do Mundo — Fábio M. Barreto (Prólogo)

Filhos do Fim do Mundo

Fábio M. Barreto




Prólogo

O resquício da forte tempestade ainda podia ser visto pelas janelas da delegacia quando o telefone tocou. As gotas caíam vagarosamente; a árvore de Natal iluminava o ambiente; quase ninguém de plantão. Ventava muito.

Os olhos da Plantonista de Emergência estavam paralisados. Arregalados. Aterrorizados. Resultado da mescla da preparação na Academia com a resposta aos gritos arrasadores do outro lado da linha. O identificador de chamadas mostrava a origem da ligação: o hospital local. Ela tentava falar, mas não conseguia. Simplesmente ficou muda e imóvel.

Outras ligações começam a preencher o painel virtual na tela do computador.

Em meio aos gritos da mulher que ligava, a Oficiala de Comunicação compreendeu a mensagem e não entendia como ainda não havia desmaiado ou passado mal por conta do estômago embrulhado. A Enfermeira da maternidade gritava a plenos pulmões e repetia a mesma frase. Um mantra agourento e desconcertante até mesmo para uma piada de mau gosto.

O painel de ligações acendia ferozmente. Notando o cenário esquisito e o crescente volume de ligações tomando todos os telefones da delegacia, o Delegado de Plantão ficou perplexo com a postura de sua colega. Deixou sua sala e a cutucou. Ela arriscou lançar um olhar, mas continuou paralisada. Balbuciou alguma coisa ininteligível. Ele puxou o telefone de apoio para atender uma das linhas, mas seu telefone celular tocou no mesmo instante.

Casa. A foto de sua esposa e seu filho apareceu no monitor.

Segundos depois de atender, o terror tomou conta de seu semblante. Lágrimas molhavam a face que se contorcia em desespero. Sua mulher berrava. Ele tinha um filho, um garoto sorridente, gordinho e bonachão de nove meses de idade.

Tinha.

Sua mulher e a Enfermeira gritavam a mesma coisa.

Seu filho estava morto.

Todas as crianças da maternidade estavam mortas. Todas.

Atrás dele, o relógio marcava meia-noite e cinco minutos. A luz verde do calendário eletrônico brilhava com ar fúnebre. Eram os primeiros minutos do fim do mundo.



O que é um prólogo? O prólogo é uma introdução presente em algumas obras literárias, frequentemente escrita pelo autor ou por uma terceira pessoa, que oferece ao leitor uma contextualização antes do início da narrativa principal. Ele pode esclarecer elementos importantes, como informações de fundo sobre os personagens, o cenário, ou a trama, preparando o leitor para a história que está por vir. Além disso, o prólogo pode explorar temas ou questões que serão centrais ao longo do livro, criando uma ponte entre o leitor e o universo ficcional da obra.


A Odisseia de Penélope — Margaret Atwood (Prólogo)

A odisseia de Penélope

Margaret Atwood




 Prólogo — 

A história do retorno de Odisseu a seu reino em Ítaca, após vinte anos de ausência, tornou-se conhecida principalmente graças à Odisseia de Homero. Odisseu teria passado metade desse período lutando na Guerra de Troia, e a outra metade perambulando pelo mar Egeu, tentando voltar para casa, enfrentando dificuldades, derrotando monstros ou fugindo deles, e dormindo com deusas. O caráter do “ardiloso Odisseu” tem sido muito comentado: ele ganhou fama de mentiroso persuasivo e mestre nos disfarces — um homem que vive graças a sua sagacidade, capaz de inventar estratagemas e truques, e que às vezes é esperto demais para seu próprio bem. Ele recebe a ajuda divina de Palas Atena, deusa que o admira por sua inventividade.

Na Odisseia, Penélope — filha de Icário de Esparta e prima da bela Helena de Troia — é descrita como a própria esposa perfeita e fiel, uma mulher consagrada por sua constância e por sua inteligência. Além de chorar e orar pelo retorno de Odisseu, ela engana astuciosamente os pretendentes que enxameiam em seu palácio, dilapidando o patrimônio de Odisseu na tentativa de forçar Penélope a desposar um deles. Penélope, além de iludi-los com falsas promessas, tece uma mortalha que desfaz de noite, adiando a decisão sobre o casamento para depois do término da peça.

Parte da Odisseia diz respeito aos problemas dela com o filho Telêmaco, que tenta se afirmar não só em relação aos perigosos e belicosos pretendentes, mas também contra a mãe. O livro termina com a matança dos pretendentes por Odisseu e Telêmaco, o enforcamento das doze escravas que se deitaram com os pretendentes e a reunião de Odisseu e Penélope.

Mas a Odisseia de Homero não é a única versão da história. O material mítico era originalmente oral e também local — um mito é relatado de um jeito num lugar, e de modo bem diferente em outro. Usei material diferente da Odisseia, principalmente para obter detalhes a respeito da família de Penélope, de sua vida de solteira e do casamento, além dos rumores escandalosos que circulavam a seu respeito.

Optei por entregar a narrativa a Penélope e às doze escravas enforcadas. As escravas formam o Coro, que canta e declama, concentrando-se nas duas questões que se destacam numa leitura atenta da Odisseia: o motivo do enforcamento das escravas e o real propósito de Penélope. A maneira como é contada a história na Odisseia não convence, há muitas incoerências. Sempre vivi assombrada pelas escravas enforcadas; na Odisseia de Penélope, o mesmo ocorre com Penélope.

O que é um prólogo? O prólogo é uma introdução presente em algumas obras literárias, frequentemente escrita pelo autor ou por uma terceira pessoa, que oferece ao leitor uma contextualização antes do início da narrativa principal. Ele pode esclarecer elementos importantes, como informações de fundo sobre os personagens, o cenário, ou a trama, preparando o leitor para a história que está por vir. Além disso, o prólogo pode explorar temas ou questões que serão centrais ao longo do livro, criando uma ponte entre o leitor e o universo ficcional da obra.

Segunda Fundação — Isaac Asimov (Prólogo)

Segunda Fundação

Isaac Asimov


PRÓLOGO

O Primeiro Império Galáctico durara dezenas de milhares de anos. Incluíra todos os planetas da Galáxia num regime centralizado, algumas vezes tirânico, outras vezes benevolente, mas sempre ordenado. Os seres humanos já haviam esquecido que pudesse haver qualquer outra forma de existência.

Todos, menos Hari Seldon.

Hari Seldon fora o último grande cientista do Primeiro Império. Fora ele que levara a ciência da psicohistória ao seu integral desenvolvimento. A psicohistória era a quintessência da sociologia, era a ciência do comportamento humano reduzida a equações matemáticas.

O ser humano individual é imprevisível, porém as reações das multidões humanas, descobriu Seldon, podem ser tratadas estatisticamente. Quanto maior a multidão, tanto maior a precisão que pode conseguir-se. E a grandeza das massas humanas com que Seldon trabalhava era nada menos do que a população da Galáxia que, no seu tempo, se contava por quintilhões. Foi Seldon, pois, quem previu, contra todo o senso comum e a crença popular, que o brilhante Império que parecia tão forte achava-se num estado de decadência e declínio irremediáveis.

Previu (ou resolveu as suas equações e interpretou os seus símbolos, o que vem a dar na mesma) que, entregue a si mesma, a Galáxia viria a atravessar um período de trinta mil anos de misé¬ria e anarquia antes de se estabelecer mais uma vez um governo unificado.

Meteu mãos à obra para remediar a situação, para provocar um estado de coisas que restaurasse a paz e a civilização num único milhar de anos.

Cuidadosamente, instalou duas colônias de cientistas a que denominou "Fundações". Instalou-as, deliberadamente, "em extremos opostos da Galáxia".

Uma Fundação foi estabelecida à luz plena da publicidade. A existência da outra, a Segunda Fundação, foi abafada pelo silêncio. Em Fundação (Gnome, 1951) e Fundação e Império (Gnome, 1952) descrevem-se os três primeiros séculos da história da Primeira Fundação. Começou como uma pequena comunidade de Enciclopédicos perdida no vazio da periferia exterior da Galáxia. Enfrentava crises periódicas a que era conduzida pelas variáveis das relações humanas e das correntes sociais e econômicas do tempo. Sua liberdade de movimentos estava restrita apenas a uma curta linha e quando se movia nessa direção abria-se diante dela um novo horizonte de desenvolvimento. Tudo fora planejado por Hari Seldon, então já morto há muito tempo.

A primeira Fundação, com a sua ciência superior, apoderou-se dos planetas bárbaros que a rodeavam. Enfrentou os anárquicos Condestáveis que deixaram o Império moribundo e derrotou-os. Enfrentou o que restava do próprio Império, sob o seu último Imperador forte e o seu último General forte, e derrotou-o.

Depois enfrentou algo que Hari Seldon não previra: o poder irresistível de um simples ser humano, um Mutante. A criatura, conhecida por O Mulo, nascera com a aptidão de moldar as emoções dos homens e de forjar as suas mentes. Os seus mais encarniçados opositores transformaram-se nos seus servos mais devotados.

Os exércitos não podiam, não queriam lutar contra ele. Perante ele, a Primeira Fundação caiu e os planos de Seldon transformaram-se parcialmente em ruínas.

Restava, porém, a misteriosa Segunda Fundação, o alvo das buscas. O Mulo devia encontrá-la para tornar completa a sua conquista da Galáxia. Os fiéis ao que restava da Primeira Fundação tinham de encontrá-la por uma razão totalmente oposta. Mas onde estava ela? Isso, ninguém sabia.

Esta é, então, a história da procura da Segunda Fundação!


O que é um prólogo? O prólogo é uma introdução presente em algumas obras literárias, frequentemente escrita pelo autor ou por uma terceira pessoa, que oferece ao leitor uma contextualização antes do início da narrativa principal. Ele pode esclarecer elementos importantes, como informações de fundo sobre os personagens, o cenário, ou a trama, preparando o leitor para a história que está por vir. Além disso, o prólogo pode explorar temas ou questões que serão centrais ao longo do livro, criando uma ponte entre o leitor e o universo ficcional da obra.

Fundação e Império — Isaac Asimov (Prólogo)

Fundação e Império

Isaac Asimov



PRÓLOGO

A Decadência do Império Galáctico.

Era um Império colossal, alargando-se por milhões de mundos que iam de extremo a extremo da poderosa espiral dupla que formava a Via-láctea.

Esteve em declínio durante séculos antes de um homem se tornar realmente ciente dessa decadência. Este homem foi Hari Seldon, o homem que representou a única fagulha de esforço criador no meio da pressão da decadência. Criou e elevou a um alto grau de perfeição a ciência da psicohistória.

A psicohistória trabalha considerando não o homem, mas o homem-massa.

Era a ciência da multidão, multidão considerada no seu total de bilhões. Podia prever as reações com uma precisão que uma ciência menor só poderia resolver e prever com o mesmo rigor do ressalto de uma bola de bilhar. A reação de um homem não podia ser prevista utilizando a matemática, a reação de um bilhão é algo diferente.

Hari Seldon delineou as tendências sociais e econômicas da época, estendeu para frente as curvas evolutivas e previu o acelerado declínio da civilização e o intervalo de trinta mil anos que deveria transcorrer antes de um novo Império vigoroso poder emergir das ruínas.

Era muito tarde para impedir esse declínio, mas não muito tarde para impedir o aparecimento de um interregno de barbarismo. Seldon estabeleceu duas Fundações nos "extremos opostos da Galáxia" e a sua localização foi de tal modo calculada que os acontecimentos de um milênio deviam unir-se e entrelaçar-se de tal modo que levassem ao nascimento mais rápido de um Segundo Império, mais robusto e mais duradouro.

Fundação (Gnome Press, 1951) contou a história de uma destas Fundações durante os dois primeiros séculos de vida.

Começa com um povoamento de cientistas físicos em Terminus, um planeta colocado na extremidade de um dos braços da espiral da Galáxia. Separados dos distúrbios do Império, esses cientistas trabalharam como compiladores de um compêndio de conhecimento universal, a Enciclopédia Galáctica, desconhecendo o profundo papel que lhes fora destinado pelo já falecido Seldon.

Como o Império se fosse corrompendo, as outras regiões caíram nas mãos de "reis" independentes. A Fundação viu-se ameaçada por eles. Contudo, atirando os insignificantes soberanos uns contra os outros, sob a orientação do primeiro prefeito, Salvor Hardin, conseguiram manter uma independência precária. Sendo os únicos possuidores da força atômica no meio de mundos que estavam perdendo a cultura e regressando ao carvão e ao petróleo, conseguiram, por isso, ganhar um ascendente. A Fundação tornou-se o centro "religioso" dos reinos vizinhos.

Vagarosamente, a Fundação criou uma economia comercial ao mesmo tempo que a Enciclopédia recuava para um plano mais distante. Os seus comerciantes, negociando com instrumentos atômicos que o Império nem sequer podia ter copiado nos seus dias de maior solidez, penetravam centenas de anos-luz através da Periferia.

Sob Hober Mallow, o primeiro Príncipe Mercador da Fundação, desenvolveram as técnicas de guerra econômica a ponto de derrotarem a República de Korell, embora este mundo fosse apoiado por uma das outras províncias que tinha saído do Império.

Decorridos duzentos anos, a Fundação era o Estado mais poderoso da Galáxia, com exceção dos remanescentes do Império que, concentrados no terço central da Via-láctea, ainda controlavam três quartos da população e da riqueza do Universo.

Parece inevitável que o próximo perigo a ser enfrentado pela Fundação fosse um último golpe do Império agonizante.

O futuro deve ser esclarecido pela batalha entre a Fundação e o Império. 


O que é um prólogo? O prólogo é uma introdução presente em algumas obras literárias, frequentemente escrita pelo autor ou por uma terceira pessoa, que oferece ao leitor uma contextualização antes do início da narrativa principal. Ele pode esclarecer elementos importantes, como informações de fundo sobre os personagens, o cenário, ou a trama, preparando o leitor para a história que está por vir. Além disso, o prólogo pode explorar temas ou questões que serão centrais ao longo do livro, criando uma ponte entre o leitor e o universo ficcional da obra.

Nêmesis — Isaac Asimov (Prólogo)

Nêmesis

Isaac Asimov


Prólogo

Estava ali sentado, sozinho.

Do lado de fora estavam as estrelas, e uma estrela em particular, com seu pequeno sistema planetário. Podia vê-la com os olhos da mente, mais nitidamente que a veria na realidade se se desse ao trabalho de tornar a janela transparente.

Uma estrela pequena, avermelhada, da cor do sangue e da destruição e com um nome apropriado.

Nêmesis!

Nêmesis, a deusa da vingança divina.

Pensou novamente na história que ouvira na infância: uma lenda, um mito, uma fábula a respeito de um dilúvio universal que dizimara a humanidade pecadora, deixando apenas uma família para começar tudo de novo.

Desta vez, não ia haver nenhum dilúvio. Apenas Nêmesis.

A degeneração da humanidade tinha acontecido de novo e a vinda de Nêmesis era um castigo apropriado. Não seria um dilúvio. Nada tão simples quanto um dilúvio.

Mesmo que houvesse sobreviventes... para onde iriam?

Por que não sentia nenhuma tristeza? A humanidade não podia continuar daquele jeito. Estava morrendo aos poucos, em consequência dos próprios crimes. Se a morte lenta e sofrida fosse substituída por uma muito mais rápida, isso seria motivo de tristeza? Ali, em órbita em torno de Nêmesis, havia um planeta. Em órbita em torno do planeta, um satélite. Em órbita em torno do satélite, havia Rotor.

No antigo dilúvio, os sobreviventes haviam usado uma arca. Tinha apenas uma ideia vaga do que era uma arca, mas Rotor desempenharia o mesmo papel. Levava com ele uma amostra da humanidade que estava a salvo e que construiria um mundo novo e muito melhor.

Para o velho mundo, porém... só havia Nêmesis!

Pensou de novo na questão. Uma estrela anã vermelha, em sua trajetória inexorável. Ela própria e seu sistema planetário não corriam nenhum perigo. O mesmo não se podia dizer da Terra.

Terra, Nêmesis está chegando!

Trazendo com ela a Justiça Divina!


O que é um prólogo? O prólogo é uma introdução presente em algumas obras literárias, frequentemente escrita pelo autor ou por uma terceira pessoa, que oferece ao leitor uma contextualização antes do início da narrativa principal. Ele pode esclarecer elementos importantes, como informações de fundo sobre os personagens, o cenário, ou a trama, preparando o leitor para a história que está por vir. Além disso, o prólogo pode explorar temas ou questões que serão centrais ao longo do livro, criando uma ponte entre o leitor e o universo ficcional da obra.

Todo o que acontece — Douglas Adams (poema)

 


Até Mais, e Obrigado Pelos Peixes! — Douglas Adams (Abertura)

Até Mais, e Obrigado Pelos Peixes!

Douglas Adams


Prólogo

Muito além, nos confins inexplorados da região mais brega da Borda Ocidental desta Galáxia, há um pequeno sol amarelo e esquecido.

Girando em torno deste sol, a uma distância de cerca de 148 milhões de quilômetros, há um planetinha verde-azulado absolutamente insignificante, cujas formas de vida, descendentes de primatas, são tão extraordinariamente primitivas que ainda acham que relógios digitais são uma grande idéia.

Este planeta tem - ou melhor, tinha - o seguinte problema: a maioria de seus habitantes estava quase sempre infeliz. Foram sugeridas muitas soluções para esse problema, mas a maior parte delas dizia respeito basicamente à movimentação de pequenos pedaços de papel colorido com números impressos, o que é curioso, já que no geral não eram os tais pedaços de papel colorido que se sentiam infelizes.

E assim o problema continuava sem solução. Muitas pessoas eram más, e a maioria delas era muito infeliz, mesmo as que tinham relógios digitais.

Um número cada vez maior de pessoas acreditava que havia sido um erro terrível da espécie descer das árvores. Algumas diziam que até mesmo subir nas árvores tinha sido uma péssima idea, e que ninguém jamais deveria ter saído do mar.

E, então, uma quinta-feira, quase dois mil anos depois que um homem foi pregado num pedaço de madeira por ter dito que seria ótimo se as pessoas fossem legais umas com as outras para variar, uma garota, sozinha numa pequena lanchonete em Rickmansworth, de repente compreendeu o que tinha dado errado todo esse tempo e finalmente descobriu como o mundo poderia se tornar um lugar bom e feliz. Desta vez estava tudo certo, ia funcionar, e ninguém teria que ser pregado em coisa nenhuma.

Infelizmente, porém, antes que ela pudesse telefonar para alguém e contar sua descoberta, aconteceu uma catástrofe terrível e idiota e a idea perdeu-se para todo o sempre.

Esta é a história dessa garota. 


O que é um prólogo? O prólogo é uma introdução presente em algumas obras literárias, frequentemente escrita pelo autor ou por uma terceira pessoa, que oferece ao leitor uma contextualização antes do início da narrativa principal. Ele pode esclarecer elementos importantes, como informações de fundo sobre os personagens, o cenário, ou a trama, preparando o leitor para a história que está por vir. Além disso, o prólogo pode explorar temas ou questões que serão centrais ao longo do livro, criando uma ponte entre o leitor e o universo ficcional da obra.