ABISMO DO
TEMPO
Roberto Schima
No
alto da montanha, naquele planeta, a jovem esperou pelo seu retorno, conforme
ele prometera que faria. Ela observara a nave dele partir, segurando o choro
até o último instante, sem se dar conta de que, antes disso, havia muito que as
lágrimas rolavam. Não tardara para o veículo transformar-se em mais uma
estrela, até confundir-se no céu com aquelas constelações estranhas, ainda sem
nome - se é que os poucos que tinham ficado iriam dar-se a esse trabalho.
E
ela esperou.
Esperou.
E
esperou.
E
o tempo passou.
E
a noite continuou estrelada, porém, silenciosa.
E,
um dia, deu-se conta de que as lágrimas, enfim, tinham secado.
As
memórias, às vezes, podiam ser como escritas na areia da praia. Dependendo da
maré, apagar-se-iam para sempre. Aconteceu isso com ela. Gradualmente, a idade,
o tempo, a moléstia, foram roubando-lhe,grama a grama, punhados cada vez maior
de suas recordações.
E
chegou o dia em que se esqueceu da nave.
E
chegou o dia em que se esqueceu da saudade.
E
chegou o dia em que se esqueceu de seu próprio nome.
E,
enfim, chegou o dia em que se esqueceu de esquecer.
O
destino poderia ser piedoso quando queria.
Ninguém
soube que nome colocar na lápide da velha, todavia, por obra do acaso, da
providência divina ou por uma estranha coincidência, enterraram-na no sopé
daquela montanha onde, um dia, olhos tristonhos e esperançosos tentaram
alcançar e tocar as estrelas.
E
o tempo passou.
E
a poeira cresceu.
E
nada do céu desceu.
E
a pequena comunidade naquele mundo que não era o seu definhou. Uns diriam que
fora a fome; outros, a doença; outros, as desavenças. Diriam, se tivesse
sobrado alguém para contar a história.
Então,
enfim, numa noite como tantas outras noites, uma esteira de chamas riscou o
tecido negro do espaço.
A
nave - aquela nave! - pousou.
E
o homem, ainda jovem, apressado, saltou.
Procurou,
procurou e procurou.
Chegou
a tropeçar nos restos do que fora uma lápide sem nome.
Carcomida.
Corroída.
Esquecida.
Viu
as ruínas e o que elas diziam acima delas.
Para
ele, a partida tinha sido praticamente ontem, uma semana a bem dizer.
Para
ele.
Todavia...
O abismo do tempo abriu diante de si.
Impactante.
Indiferente.
Implacável.
Irreversível.
E
foi a vez dele chorar para as estrelas.
Sem
encontrar consolo.
Sem
esperar um retorno.
Sem
descobrir respostas na noite sem fim.
Sem
rever um rosto amado a esperá-lo no céu.
Não.
Sem
espera.
E
sem esperança.
E
o jovem de corpo, porém, agora, velho de espírito. Arrastou seus pés pela
poeira daquele mundo tão longínquo do seu. Um planeta que, a princípio
encerrara inúmeras promessas. Era bom. Bom demais.. Tantas promessas não
cumpridas, como suas próprias promessas agora levadas pelo vento, no tempo, ao
relento.
E
descobriu como o vazio do espaço, as incríveis distâncias entre os astros,
poderiam existir dentro de si.
O
espaço.
O
vazio.
E
nenhum ganho futuro que aquele mundo pudesse reservar para ele e sua tripulação
iriam preencher o abismo da perda.
Deixou-se
ficar na poeira, entre rochedos e uma rala vegetação, a pouco metros de uma
sepultura esquecida.
Sem
glória.
Sem
história.
Sem
memória.
Maravilhoso
ResponderExcluirUma versão ligeiramente ampliada dessa história foi vencedora do concurso de contos "Os Viajantes do Tempo", promovido pela revista digital "Conexão Literatura" (http://www.revistaconexaoliteratura.com.br/), sendo publicada em sua edição nº 37 (Julho/2018). Para os interessados, o download gratuito poderá ser feito em:
ResponderExcluirhttp://www.fabricadeebooks.com.br/conexao_literatura37.pdf