Computador orgânico autônomo em Greg Bear – Blood Music, 1985

GRANDES TEMAS DA FICÇÃO CIENTÍFICA 

Computador orgânico autônomo 

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Ele caminhou até o VDT e apertou um botão no teclado. O arquivo computadorizado secreto de Vergil começou a aparecer na tela. Seus olhos se arregalaram e sua garganta apertou, mas para seu crédito, ela não engasgou. Sua reação foi muito controlada.

– Eu não li direito, mas parece que você está fazendo algumas coisas muito suspeitas. Possivelmente antiético. Aqui na Genetron gostamos de seguir as diretrizes especialmente à luz de nossa posição futura no mercado. Mas não apenas por causa disso. Gosto de acreditar que administramos uma empresa ética aqui.

– Não estou fazendo nada antiético, Gerald.

– Hã? – Harrison desligou o monitor. Você está projetando novos complementos de DNA para vários microrganismos regulamentados pelos Institutos Nacionais de Saúde. E você está trabalhando com células de mamíferos. Aqui não trabalhamos com células de mamíferos. Não temos equipamentos para riscos biológicos, pelo menos não nos laboratórios principais. Mas suponho que você pode me mostrar a segurança e inocuidade de sua pesquisa. Você não está criando um novo tipo de praga para vender aos revolucionários do Terceiro Mundo, está?

– Não, – Vergil disse em um tom neutro.

– Bom. Parte deste material está além da minha compreensão. Parece que você está tentando estender nosso projeto BAM. Pode haver algo de interessante nele. Ele fez uma pausa. Que diabos você está fazendo, Vergil?

Vergil tirou os óculos e os limpou na ponta do jaleco. Ele espirrou forte e alto, expelindo um monte de muco.

Harrison parecia ligeiramente enojado.

– Só descobrimos o código ontem. Por acaso, quase. Por que você escondeu isso de nós? Isso é algo que você prefere que ignoremos?

Sem os óculos, Vergil parecia uma coruja indefesa. Ele começou a balbuciar uma resposta, então parou e empurrou sua mandíbula para frente. Suas sobrancelhas grossas e negras se uniram em um cume doloroso.

– Parece que você tem feito algum trabalho com nossa máquina genética. Sem autorização, é claro, mas você nunca obedeceu muito à autoridade.

O rosto de Vergil agora estava vermelho escarlate.

– Você está bem? Harrison perguntou. Ele agora estava tendo um prazer perverso em atormentar Vergil, e um sorriso ameaçou romper sua expressão questionadora.

– Estou bem, – disse Vergil. – Eu estava… estou… trabalhando em biologia.

– Biologia? Não estou familiarizado com o termo.

– Um ramo lateral do biochip. Computador orgânico autônomo.

A simples ideia de acrescentar algo mais lhe dava uma sensação de agonia. Ela havia escrito para Bernard - sem sucesso, aparentemente - para convencê-lo a vir ver o trabalho. Ele não queria mostrá-lo apenas para Genetron, de acordo com as disposições da cláusula de trabalho temporário de seu contrato. Era uma ideia simples, apesar de o trabalho ter levado dois anos de trabalho secreto e árduo.

– Estou intrigado. Harrison virou o VDT e continuou a executar a lista. Não estamos falando apenas de proteínas e aminoácidos. Você também trabalhou com cromossomos. Recombinando genes de mamíferos; até mesmo, eu vejo, misturando genes virais e bacterianos. A luz se esvaiu de seus olhos, tornando-se um cinza de pedra. Você poderia desligar o Genetron agora, agora mesmo, Vergil. Não nos qualificamos para este tipo de trabalho. Você nem está trabalhando sob o controle do P-3.

– Não estou brincando com os genes envolvidos na reprodução.

– Existe alguma outra classe?– Harrison deu um pulo para a frente, enfurecido com a ideia de Vergil tentando tirá-lo do caminho.

– Íntrons. Cadeias que não codificam a estrutura da proteína.

– O que acontece com eles?

– Estou trabalhando apenas nessas áreas. E… adicionando mais material genético não reprodutivo.

– Isso tudo me parece uma contradição conceitual. Vergílio. Não temos provas de que os íntrons não façam parte do código.

– Sim, mas…

– Mas... – Harrison ergueu a mão. – Isso tudo é bastante irrelevante. O que quer que você estivesse procurando, o fato é que você estava disposto a renegar seu contrato, ir pelas nossas costas para encontrar Bernard e tentar obter seu apoio em um assunto pessoal. Certo?

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Blood Music
Greg Bear
1985

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Vergil Ulam foi o gênio do projeto biológico. A reestruturação das células. Células capazes de pensar. Quando Genetron cancelou o projeto, Vergil tirou o trabalho de sua vida do laboratório da única maneira que pôde: injetando-se com eles.

A princípio, os efeitos dos linfócitos inteligentes eram pequenos milagres. Sua visão, seu estado geral de saúde e até sua vida sexual melhoraram.

Mas agora, algo estranho está acontecendo. O tecido celular de Vergil é capaz de formar organismos complexos e até sociedades inteiras em seu sangue e corpo. Vergil carrega um universo com ele. Um universo de células. Células inteligentes que pensam que chegou a hora de agir.
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